Sociólogos, titulares de políticas públicas, activistas e até a ONU há muito que queriam saber a composição étnica dos portugueses. Finalmente, em 22 de Dezembro, o Instituto Nacional de Estatística divulgou o “Inquérito às Condições de Vida, Origens e Trajectórias da População Residente” (ICOT). Ficámos a saber que mais de 7% da população — 535,6 mil portugueses — declara-se não-branca. Concretamente, 6,4 milhões de pessoas identificam-se como brancas, 169,2 mil como negras, 56,6 mil como asiáticas, 47,5 mil como ciganas e 262,3 mil com origem ou pertença mista.
Também se ficou a saber que 1,4 milhões de pessoas descendem de imigrantes: 947,5 mil são imigrantes de primeira geração e 65,2% reside em Portugal há mais de dez anos. A população que se identifica com os grupos étnicos negro, asiático e de origem ou pertença mista tem as maiores proporções de descendência de imigrantes (90,3%, 83,7% e 69,2%, respectivamente).
Mais de 1,2 milhões de pessoas disseram ter sofrido discriminação; e mais do dobro (2,7 milhões) presenciou actos de discriminação. O trabalho e a procura de emprego foram as circunstâncias mais referidas. A seguir estão a escola e instituições públicas. A procura de cuidados de saúde ou de serviços sociais, o contacto com a polícia, acesso ao crédito ou empréstimo bancário ou a própria família foram as outras situações apontadas. No entanto, só 8,8% fizeram queixa… Talvez os 15,6% que tiveram má experiência com a polícia tenham demovido a maioria.
A professora Inocência Mata, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, que integrou o “Grupo de Trabalho Censos 2021”, entrevistada pelo jornal Público, salienta que a discriminação atinge violentamente os negros que não são subalternos e não se assumem como subalternos… São considerados altivos e ingratos e são muito discriminados.
Este ICOT deita por terra a visão lusotropicalista prevalecente. A discriminação dos não-brancos não é pontual, quando cerca de metade das pessoas inquiridas diz já ter sido discriminada. A professora Inocência Mata conclui que, havendo cerca de 7% da população a referir-se como não-branca, o país “tem de parar de se pensar como caucasiano”.
No seu modo desassombrado, Umberto Eco anunciou em Setembro de 2015, numa das últimas entrevistas que deu, que nos próximos anos a Europa mudará de cor. É óbvio que será assim, porque é inevitável e porque convém à Humanidade. Infelizmente, não será pacífico. Muitas mentalidades resistirão e haverá violência. Em Portugal, com a ascensão populista, também podemos esperar o pior. O que é certo é que este país ainda esbranquiçado ficará cada vez mais colorido, heterogéneo e mestiço. A miscigenação será também cultural. Seremos, então, mais belos e ricos que nunca. A variedade fenotípica será tida como característica basilar da portugalidade. E o orgulho na nossa diversidade será contagiante.
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