Sexta-feira, 08h30. Um grupo de veteranos encontra-se no largo combinado, para depois se deslocar para as vinhas da Casa Nicolau.
No dia que está a começar quente um grupo atarefa-se a colher os bagos, naquela que será a última jornada de um trabalho que já começou há uma semana.
Horácio Nicolau, proprietário de cerca de 30 hectares de vinha plantada, é quem carrega um a um os cestos apinhados de uvas para o trator. Leva tintas e brancas.
Com o trabalho já a meio caminho, porque noutros dias em algumas das suas vinhas “já andaram as máquinas a colher os bagos”, Horácio Nicolau estima terminar esta semana a vindima.
O produtor sabe que a tradição já não é o que era e que assim “sai mais barato”, disse o responsável, referindo-se à colheita mecânica que lhe poupou uns dias de trabalho. “Em quatro horas tenho tudo vindimado e não tenho de me preocupar em arranjar pessoal”, explicou, referindo que este ano conta com apoio de apenas dez trabalhadores, que pontualmente “vêm ajudar”. Até porque “não os há e com a pandemia pior ainda”. Contudo, “aos que há são exigidos todos os cuidados de prevenção contra a Covid-19”.
Uns vêm para arranjar um dinheiro extra, outros para ajudar, porque gostam das vindimas. Também há quem aos 85 anos continue a pegar na tesoura e quem tenha vindo vindimar pela primeira vez.
Outra tradição que se tem perdido é o pisar da uva. “Isso era no tempo dos nossos pais. Agora é tudo mecanizado e a verdade é que no final o néctar fica mais apurado e com melhores aromas. Não leva aquele verdete dos engaços”, justificou Horácio Nicolau, que herdou o gosto pela vinha dos pais e avós. “Depois de colocadas no trator, as uvas são encaminhadas para a quinta em Adão Lobo, para serem posteriormente bombeadas e esmagadas”, explicou o responsável, adiantando que no caso das uvas brancas, essas são bombeadas diretamente para a prensa, e nas tintas são bombeadas para cubas onde aguardam pelo processo de fermentação.
Para este produtor de vinhos brancos e tintos, já reconhecidos com vários prémios, “a estimativa é que este ano, a produção seja média em relação ao ano passado, mas com uvas em bom estado de maturação”. Apesar de “não ser um dos melhores anos” em termos de produção, Horácio Nicolau estima que a colheita de 2020 apresente vinho de boa qualidade, com “uvas a apresentarem bons graus”.
Receção das uvas é feita de “forma diferente”
Enquanto num lado o corte do cacho ainda se mantém cem por cento manual, noutro o processo de colheita vai-se adaptando às novas tecnologias, modernizando este método. Um exemplo disto é a Adega Cooperativa da Vermelha, que com 350 associados e plantação própria já começou na passada sexta-feira a receber colheita das suas uvas através do processo mecânico, que posteriormente dará origem a “um bom vinho”, afirmou o presidente da Adega, Rui Soares.
Segundo o responsável, “tal como aconteceu o ano passado, este ano as condições climatéricas também nos ajudaram a ter um bom néctar. Em relação aos vinhos brancos, a perspetiva é ter entre 10 a 15% mais de produção, com um grau alcoólico um pouco acima do ano passado. Em relação aos tintos temos uma previsão de que a produção seja idêntica à do ano passado”.
Nesta adega, o processo de receção das uvas é feita de “forma diferente” consoante o pressuposto de vendas e das necessidades que a cooperativa tem para canalizar as uvas para certos vinhos. “É feito um escalonamento das vindimas com datas para receber castas específicas”, explicou o responsável pela parte da gestão financeira e comercial da Adega, Nuno Rodrigues, dando como exemplo o caso das castas brancas, “que são aquelas que estamos a receber agora”, Fernão Pires, Moscatel Graúdo e Arinto, e as castas tintas, como por exemplo Aragonês e Syrah, que deverão ser cortadas uma semana mais tarde.
Este processo, que faz com “estejamos com vinhos cada vez mais reconhecidos no mercado, não só pela marca e pelo consumidor, como também em concursos nacionais e internacionais”, deverá durar pelo menos três semanas.
Apanha das uvas com máscara e distanciamento
Com mais de 1400 hectares, a adega nestes dias vê o movimento aumentar, com a entrada e saída de associados, que “chegam todos os dias com as devidas precauções contra a Covid-19, e colocam o seu equipamento no sistema informático, onde posteriormente são encaminhados até aos respetivos tegões, que contêm a sua variedade, para deixar as suas uvas”.
Apesar de este ano “termos menos pessoas do que o ano passado”, a vindima tem sido foi feita de forma diferente, pois a Covid-19 impediu a proximidade a que os participantes estavam acostumados. A habitual animação talvez se tenha mantido, mas as risadas são filtradas pelas máscaras. No geral, a Adega soube lidar com esta nova realidade, estabelecendo normas tais como o distanciamento social e o uso de máscaras.
“Durante as vindimas implementamos um plano de contingência, que implica uma separação física dos trabalhadores. Os que estão afetos à linha não podem estar misturados com os trabalhadores afetos à campanha, bem como não podem estar juntos nos espaços de refeições e balneários. Já dentro da adega, temos um protocolo que está a ser respeitado, com álcool gel em todas áreas, máscaras e medição de temperatura”, relatou a engenheira responsável pela parte dos recursos humanos e qualidade, Catarina Siopa.
A quota de exportação está na ordem dos 50%, embora “tivéssemos quebras brutas em alguns mercados, como o Brasil e África.
“Não foi um ano mau, pois o volume de negócios cresceu”, sublinhou Nuno Rodrigues, adiantando que “em plena época de pandemia haver um crescimento no número de negócios é de facto bom”.
A adega apostou na venda de vinhos online, com oferta dos portes de envio. “No vinho não é muito normal mas foi e continua a ser uma agradável surpresa, onde verificou-se um crescimento dessa modalidade”, sublinhou o responsável, adiantando que a adega também vai continuar a apostar “em outras novidades para a marca Mundus nos próximos tempos”.
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