No caso concreto das Caldas da Rainha, a convivência associada às termas circunscreveu-se a áreas que se foram ampliando, desde as formas de comunhão inicial no seio do Hospital Termal. Para além dos edifícios e espaços verdes induzidos pela prática termal e subordinados a uma orientação médica, essas áreas de lazer difundiram-se por outros espaços exteriores, ruas, largos, praças, lojas e cafés, através das ocupações que não correspondem à norma imposta pelos clínicos, mas buscam um nível de urbanidade e de cosmopolitismo, tal como as mais famosas termas europeias, às quais eram e são associadas a distinção, a elegância e a cultura e que, presentemente, são palcos de reconhecidas manifestações artísticas, em sintonia com o espírito dos lugares.
É inegável a importância social do lazer como necessidade humana e a importância do encontro/convívio. Se as cidades foram criadas para a troca, é nos espaços públicos que se pode transacionar bens e ideias e unir, porque sem isso a sociedade estagna no impasse da intolerância e do medo. É no espaço público que, também, se forma e se fortalece a identidade de uma vizinhança e com ela a sensação de pertença e de comunidade. É inegável, também, a importância na qualidade ambiental e na saúde das cidades. Os espaços públicos tecem na cidade uma rede de fluxos e, se plantados, tornam-se pulmões verdes.
Estes requisitos urbanos são importantes nas estâncias termais, que os construíram e preservaram durante diferentes épocas históricas. A ambiência do silêncio, do ar puro e dos bons cheiros característicos são bens a preservar e a promover, sem os quais se perde uma valência importante da função de uma estância termal, seja ela rural ou urbana, com mais premência neste último caso.
Em contraste com os bons usos dos espaços verdes e das ruas e praças das Caldas da Rainha, assiste-se, frequentemente, à rudeza de uma camada da população contra a flora, a fauna e o património. No mesmo sentido e por analogia, no mais recente espaço digital em que todos nos movemos, nascido com propósitos nobres de aproximação de povos e comunidades, assistimos à mesma boçalidade, até nos espaços de discussão dedicados a esta cidade e ao hospital termal.
Não é de estranhar que muitos caldenses se alheam, tanto do espaço público da construção de opinião e do espaço de intervenção autárquica, como do espaço em rede, porque num e noutro pulula gente que não sabe estar, parafraseando o humorista.
Até parece que, algumas vezes, a cada escrito assertivo, a cada ação de sucesso, conquistamos um inimigo e a inveja de outros, gente que nem sequer conhece, técnica ou cientificamente, alguns dos assuntos e, por vezes, nem conhece, pessoalmente, os visados da sua rudeza.
Nunca antes os seres humanos foram capazes de expressar as suas opiniões com disseminação imediata e global, mas uma coisa é expressar um sentimento e outra é doestar. É por estas razões que os melhores e mais informados sobre os assuntos de interesse da comunidade vão sendo substituídos, em lugares de decisão e em plataformas de opinião, por sua desistência. Mas as redes urbanas e as redes digitais nunca poderão deixar de ser genuinamente alegres, contra a idiotice que existe em ambas, que é o gérmen dos fenómenos de ofensa democrática e da ditadura da estupidez.
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