O perigo invisível dos emails “engraçados”

21 de Dezembro de 2025

Há comportamentos insidiosos nos locais de trabalho que não aparecem em relatórios nem se medem em métricas de produtividade. Um deles é a cumplicidade disfarçada de humor: aquela sequência de emails “engraçados”, piadas e anedotas que certos colaboradores enviam às chefias e aos seus pares, fora de qualquer contexto profissional.

 

À primeira vista, parece um comportamento inocente e inócua. Um toque de leveza, um gesto de simpatia e boa disposição. Mas, de facto, este tipo de comunicação informal é a face visível de um jogo de influência e manipulação relacional que se insere frequentemente num contexto de bullying profissional cuidadosamente urdido.

Quando um subordinado estabelece contacto frequente com a hierarquia através de mensagens humorísticas, está, na prática, a construir um canal emocional paralelo: uma relação de proximidade que escapa ao controlo institucional. E esse canal, aparentemente banal, condiciona decisões, altera perceções e fragiliza hierarquias. O resultado raramente é neutro.

Num contexto de tensão ou conflito interno, o “trabalhador simpático” passa a gozar de capital afetivo junto da chefia. A sua imagem é filtrada pela boa disposição e pela familiaridade. Já quem mantém uma postura profissional, contida e objetiva — muitas vezes a vítima do comportamento abusivo — começa a ser visto como o “chato”, “o difícil de líder”, o “excessivamente rígido” ou o “sem espírito de equipa”.

O humor converte-se, assim, em arma social. Serve para desarmar, desviar e proteger o agressor. É o escudo perfeito do assédio ascendente, aquele em que o subordinado mina discretamente a autoridade de quem deveria respeitar. O ataque nunca é frontal: é envolto em piadas, trocadilhos, permeado pela expressão “estou só a brincar” e aparente leveza. O que parece “carisma” ou “popularidade/simpatia” é, muitas vezes, uma forma subtil e muito engenhosa de manipulação onde é fácil cair pela simples passividade e aceitação deste tipo de mensagens.

As chefias que toleram – ou pior, incentivam pela sua inércia – este tipo de comportamento não estão apenas comprometer a sua própria autoridade: estão a destruir a coesão da equipa que coordenam ou a premiarem comportamentos pouco profissionais e éticos. Porque ao aceitarem o riso como forma de comunicação hierárquica, deixam de ser líderes e passam a ser cúmplices emocionais numa rede cuidadosamente urdida para obtenção de vantagens futuras. A imparcialidade perde-se, o profissionalismo dissolve-se e instala-se um ambiente onde a lealdade se compra com gargalhadas.

Não há liderança saudável onde o respeito é substituído por cumplicidade. Não há cultura de confiança quando a influência se conquista com piadas. E não há neutralidade possível quando o humor se transforma em instrumento de poder.

As organizações precisam de entender isto com urgência: a comunicação informal tem limites, e o papel da chefia é garanti-los.

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