Rússia, Turquia, Egipto, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos têm armado as partes beligerantes por cobiça dos recursos naturais sudaneses, sobretudo ouro, e pela importância da base naval de Porto Sudão no controle do Mar Vermelho.
Nesta confrontação já morreram entre 150 mil a 400 mil pessoas em combates e muitas mais de fome e doenças. Segundo Filippo Grandi, responsável pela ACNUR, a agência da ONU para os refugiados, um terço da população, cerca de 17 milhões, está deslocada, dos quais, 3,8 milhões são deslocados internos e mais de 13 milhões fugiram para os países vizinhos — Egipto, Sudão do Sul, Chade, Líbia, Etiópia, República Centro-Africana e até para o Uganda.
A ONU decretou em 2024 a situação de fome no campo de refugiados de Zamzam, em Darfur do Norte. De então para cá, a situação de fome no Sudão tornou-se mais grave do que a do Biafra, nos anos 60, e da Etiópia, nos anos 80. Segundo a ACNUR, nestes dois anos e meio de guerra, o número recorde de deslocados e a quase inexistente ajuda humanitária levou 25 milhões de pessoas à situação de fome extrema.
Em Zamzam, o único campo de refugiados sobre o qual a ONU tem informações rigorosas, a cada duas horas morre uma criança vítima de fome ou doença. As estatísticas dizem que cerca de 100 pessoas morrem por dia de fome no Sudão. Haver combates muito intensos na região do Nilo, que é o celeiro do país, agrava ainda mais a situação de fome. As forças de intervenção rápida actuam sobretudo nesta zona, destruindo tudo, desde tractores a sementeiras. Os campos agrícolas nada têm para colher.
Paradoxalmente, à medida que o conflito e o número de deslocados se intensificaram, o financiamento humanitário foi minguando, ficando-se por menos de 10% do necessário, tornando impossível cobrir as necessidades básicas, como o mero acesso à água potável.
Em 2024, a Organização Mundial da Saúde alertou para a inevitabilidade de surtos de doenças infecciosas, devido à inexistência de um sistema de saúde e de serviços básicos, e têm-se registado dezenas de milhares de casos de cólera e dengue.
Outra terrível agravante é a violência sexual. Milhões de crianças e mulheres estão sob ameaça. A Unicef relata que 66% das vítimas infantis de violação são meninas. Há inúmeros relatos de experiências de violência sexual sistémica, além de testemunhos de massacres. Milhares destas crianças surgem desacompanhadas, sem qualquer família.
Apesar de os relatores da ONU demonstrarem que a crise humanitária no Sudão é a pior de todo o mundo, tarda a solução política para a paz e a população sudanesa continua abandonada à sua sorte.
Como se explica a apatia generalizada perante todo este horror?
Francisco Martins da Silva
Escrevo segundo o anterior acordo ortográfico










