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Pai procura filhas desaparecidas há nove anos

Francisco Gomes

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Ricardo André, de 46 anos, residente em Alcobaça, diz viver há quase nove anos com “uma ferida aberta” – não vê desde então as suas duas filhas, na altura com 12 e 18 anos, desconhecendo “se estão vivas, se vivem em Portugal ou se terão saído do país”.
Ricardo André não sabe se as duas filhas terão saído do país

Depois de 16 anos de casamento, a sua mulher saiu de casa com as raparigas, quando ambas ainda eram menores e ela tinha 34 anos. Durante quase um ano o pai ainda comunicou regularmente com as filhas, que estavam com ele de quinze em quinze dias, mediante acordo verbal enquanto não se formalizava a regulação do poder paternal, até que de repente perdeu o contacto.

“Desde o dia 25 de maio de 2012 nunca mais consegui estar com as minhas filhas. Deixaram de atender o telefone. A mãe desapareceu com elas sem deixar rasto”, contou Ricardo André, que soube, mais tarde, que terá refeito a vida com outro homem e que estavam a viver em São Martinho do Porto. Admite a possibilidade de o desaparecimento estar relacionado com o companheiro da ex-mulher, um ano e meio mais novo do que ela, antigo pastor de uma organização religiosa, com cadastro por furto qualificado por arrombamento de edifício e que terá estado envolvido em vários crimes e se encontra contumaz (arguido que, não tendo prestado termo de identidade e residência, não foi possível notificar para comparecer em julgamento).

As sucessivas queixas que fez a várias autoridades policiais, desde junho de 2012, nunca tiveram resultado. Inclusive procurou na justiça apoio para encontrar as filhas, sem sucesso. O processo foi arquivado por falta de provas de crimes de subtração de menor e de sequestro.

Sem respostas, Ricardo André usa as redes sociais para divulgar o desaparecimento e pedir ajuda. Mesmo agora tendo elas idade adulta, comenta que a sua família “vive mergulhada no desgosto” e que o que mais o assusta é “a possibilidade de morrer sem saber das minhas filhas e se não terão sido maltratadas”. Não pede mais do que “um sinal de vida”.

Recentemente fez uma exposição ao Presidente da República. A casa civil da presidência respondeu que foi remetida à Procuradoria-Geral da República, que por sua vez encaminhou para o Ministério Público da Comarca de Leiria. “Estou a aguardar alguma comunicação”, transmitiu Ricardo André.

Abandono escolar

As diligências efetuadas em 2012 por diversas entidades revelaram que a filha menor abandonara o ensino básico, apesar de estar matriculada automaticamente no 8º ano na Escola Frei Estevão Martins, em Alcobaça, que não frequentou. A mais velha não tinha concluído o secundário.

Ambas efetuaram o último contacto de enfermagem na Unidade de Saúde Familiar Pedro e Inês, em Alcobaça, a 15 de janeiro de 2013, depois das queixas de desaparecimento apresentadas na PSP e na PJ.

Hotel por pagar

Uma carta anónima enviada em 2013 à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Oliveira do Bairro revelou que a rapariga menor se encontrava num hotel naquela localidade a residir com a irmã, a mãe e o companheiro desta. O proprietário confirmou à PJ que deram entrada a 11 de maio de 2012. Em janeiro do ano seguinte, o companheiro da mãe abandona o alojamento sem liquidar as despesas. Elas permanecem até 30 de junho, desaparecendo após o contacto da CPCJ com o proprietário, deixando haveres e uma extensa conta para pagar.

Negócios obscuros

O companheiro da ex-mulher de Ricardo André, numa entrevista há cerca de vinte anos, contou que foi peão de negócios desde tráfico de droga ao branqueamento de capitais, passando a andar escondido com medo de represálias. A organização religiosa de que era pastor negou as acusações.

Por alegadamente ter negócios em Itália, Ricardo André receia que possam ter ido para esse país, já que a ex-mulher tentou obter o seu consentimento para levar as filhas numa viagem até lá. Diz ter recebido uma chamada da mais velha, cujo indicativo era de Itália, parecendo-lhe estar alguém a “dar-lhe indicações sobre o tipo de conversa que deveria desenvolver”.

Sem pistas para localizar

A PJ reconheceu que “apesar de existir conhecimento do desaparecimento” da mãe e filhas, “a localização das mesmas é completamente desconhecida”.

O Ministério Público do Tribunal de Alcobaça disse que se encontrava pendente o processo administrativo com vista à regulação das responsabilidades parentais, como tal, não existia crime de subtração de menor, e mesmo se já houvesse regulação, seria apenas incumprimento do judicialmente homologado por sentença a resolver em sede própria. Por estes motivos as queixas do desaparecimento foram arquivadas.

“Receio” em indicar residência

A PSP chegou a conseguir contactar com a filha mais velha, aproveitando um exame na Escola D. Inês de Castro. A jovem disse que estava “tudo bem” com ela e com a irmã, e que “estranhava a preocupação do pai, visto que desde a separação este nunca ter demonstrado grande preocupação” com elas. Tinha “algum receio” em dizer o local exato da residência, para evitar que o pai as importunasse. A PSP concluiu que “nada leva a supor que as mesmas estejam contra a vontade ou sob coação a residirem com a mãe e o companheiro desta” e que era da vontade de ambas não contactarem com o pai, o que fez cair um eventual crime de sequestro.

Divórcio à revelia

A procuradora-adjunta do Ministério Público pediu a averiguação de existência de processos pendentes relativamente ao pai – nomeadamente de maus tratos ou queixas de violência doméstica – que pudessem justificar a eventual fuga da ex-mulher e das filhas de ambos, mas nada de irregular foi apurado.

O divórcio seria consumado à revelia por falta da mulher na audiência, o que motivou um pedido da juíza a diversas entidades para apurarem o seu paradeiro, inclusive ao SEF e à Embaixada de Portugal em Itália.

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