Maria Póstuma Fausto de Sousa
Conversa recente com o historiador João Bonifácio Serra, sobre a sua descoberta, do nome de batismo da mítica D. Maria dos Cacos nos Arquivos Paroquiais, leva-me a especular sobre as linhas de partida dos ceramistas nas Caldas de novecentos.
Maria Póstuma, assim batizada por ser nascida após o passamento de seu pai, pertencia à família Fausto de Sousa.
Manuel Mafra tomou-lhe de trespasse, cito J.B.F. na entrevista à Gazeta das Caldas de 22/7/2016, a estrutura comercial em 1853.
E a estrutura industrial? Maria dos Cacos produzia? Vendia! Louça monocromática: vidrada a castanho, verde, cor de mel…paliteiros com formas de animais, o homem no pipo, a célebre mulher-garrafa com guitarra, as bilhas com segredo…faiança pesada, bem modelada e bem vidrada, que vendia em feiras por todo o país. Peças fabricadas, em princípio, pelos homens da família e colaboradores.
Tudo parece indiciar duas “linhagens”, à partida para a nova aventura da Louça das Caldas: a policromia em peças marcadas:
Manuel Mafra (1831- 1905) e José Francisco de Sousa (1835 – 1907), descendente directo dos Fausto de Sousa.
Manuel Mafra, era um oleiro habilidoso, capaz de absorver influências que lhe chegam da Europa por D. Fernando de Saxe, Coburgo e Gota, marido de D. Maria I I, Rei-Consorte, cognominado Rei-Artista, também coleccionador, de Wenceslau Cifka, ceramista, fotógrafo e engenheiro silvicultor que veio na comitiva de D. Fernando para Portugal e outros coleccionadores.
Inspirando-se em modelos europeus, que reproduziu na perfeição, Mafra fez obra em quantidade e qualidade, muito para além do figurado monocromático que herdou de Maria dos Cacos.
José Francisco Fausto de Sousa, da linhagem original da Cerâmica das Caldas de novecentos, segue tendência talvez mais “erudita”, caldense: seus filhos José Augusto Fausto de Sousa e Salvador Fausto de Sousa pintavam (diz-se na publicidade da casa: José Francisco de Sousa, Filho, que faziam retratos do natural ou a partir de fotografias).
Seu neto, José de Sousa, pintor naturalista de boa craveira, colabora com António Montez e outros caldenses destacados, na fundação do Museu de José Malhoa.
Uma travessa pintada a vinoso por D. Fernando II (coleção João Maria Ferreira-J.F.S. marca oval-) prova que o rei também frequentava a sua oficina.
A outorga a Mafra da Corôa Real, como Fornecedor Oficial da Casa Real, uma operação comercial paga, solicitada oficialmente pelo ceramista, foi, como se diria hoje, um golpe de marketing.
Fica o mistério, porque é que J.F.S., familiar de Maria Póstuma, não ficou com a sua estrutura industrial e comercial? “Santos de casa não fazem milagres”?
Qual o papel de António de Sousa Liso nisto tudo?…diz-se que produziu apenas de 1855 a 1860 tendo passado o negócio a José Francisco de Sousa.
J.F.S. vem a produzir alguns dos mais belos pratos de peixes em fundos de escorridos (naturezas-mortas em relevo). Um pequeno jarro com tampa -colecção João Maria Ferreira-pintado a frio, apresenta uma vista, bem conseguida da Torre da Igreja de N.S. do Pópulo, assinada J.F.S., monogramada também por seu filho, Salvador Fausto de Sousa.
Ficam as dúvidas, mistérios e interrogações em que a história da louça das Caldas é fértil. Deixo um desafio aos historiadores: que a nossa cerâmica, do século XIX e XX seja por fim investigada a sério.
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