Hoje, o Convento da Madre de Deus é sede do excelente Museu Nacional do Azulejo. Junto à entrada da Capela de D. Leonor, no pavimento do Claustro, com uma simplicidade à luz do ideal de São Francisco de Assis, conseguimos admirar três campas rasas: A de D. Isabel de Viseu (1459-1521); a da primeira abadessa desse mosteiro, a Venerável Madre Soror Coleta Talhada (…-1560); e a da Rainha D. Leonor de Lencastre (1458-1525).

Poderia, a Rainha Perfeitíssima, ter sido sepultada (como o foram outras Rainhas e Reis) num mausoléu opulentamente adornado, pois, fora a princesa mais rica da Europa e a mais respeitada, devido à sua vida de benemerência.

Porém, a Soberana, após a morte, ocorrida no Paço Real de Enxobregas, não foi para nenhum panteão nacional (Mosteiro de Santa Cruz, em Coimbra; Mosteiro de Alcobaça; Mosteiro da Batalha; Mosteiro de São Vicente de Fora; Mosteiro dos Jerónimos) associado à sua dinastia real, pois, decidira atempadamente, num sinal de extrema humildade (que emocionou todo o Reino), ser sepultada naquele Convento, numa cova-rasa, num recanto onde as pessoas a pisassem, ao por ali passarem.

A Rainha D. Leonor de Lencastre, com esse gesto, reconhece todas as suas próprias limitações e fraquezas e, agindo de acordo com a sua consciência, mostrando que, o seu bom senso, simplicidade, respeito, cordialidade e honestidade, a projetaram para patamares inalcançáveis aos avarentos, gananciosos e orgulhosos, decide resguardar os seus restos mortais do modo mais singelo possível.

A Rainha Perfeitíssima aspirou descer ao húmus, o ventre da terra, pois, sendo um seu produto, a ele retornaria, após o encerramento de sua etapa de vida, exatamente como a fórmula latina homo-humus-humilis nos esclarece. O Universo advém do Caos e a ele regressa no fim do seu ciclo. Vimos da terra e a ela retornamos.

Uma teoria que abarca a matéria, o eu profano, e não o espírito, este, após a morte, eleva-se e regressa “a Deus, que o deu” (Ec 12.7).

D. Leonor de Lencastre tinha plena ciência da sua descensão corpórea ao húmus. Como vivia em plenitude moral com o seu eu interior, compreendia que a sua viagem consistia no evoluir da alma e não nos anseios da substância. O seu corpo, vazio, já não lhe pertenceria após a morte, nem a ela, nem a ninguém, logo, não haveria razão para adorá-lo. Um pensamento ornamentado em misericórdia e remissão.

Todos os portugueses, em especial os caldenses, num gesto de humildade, deveriam, pelo menos uma vez na vida, deslocar-se ao Convento da Madre de Deus em Lisboa e, por alguns minutos, diante da cova-rasa da Rainha Perfeitíssima, agradecer-lhe por todo o Bem que ela lhes consagrou.

Ide a ela, todos os que estais fatigados e afligidos, e ela vos consolará!