— É em Jerusalém que está o lugar mais sagrado para os judeus, o Muro das Lamentações, que é uma parede do Templo de Herodes. Esta parede delimita uma das vertentes do promontório a que os judeus chamam Monte do Templo, por aí se ter erguido o templo original, construído por Salomão em 1005 a.C. e destruído por Nabucodonosor em 586 a.C.. Foi depois construído o Segundo Templo, consagrado em 516 a.C. e restaurado por Herodes em 65, e que veio a ser destruído durante a ocupação romana em 70, restando apenas o Muro.
— Para os muçulmanos, o pequeno planalto no topo deste Monte do Templo é a Esplanada das Mesquitas, onde se situa a Cúpula da Rocha, ou Mesquita de Omar, o santuário que foi erguido no local onde se acredita ter existido o altar de sacrifícios utilizado por Abraão, o profeta que é partilhado por cristãos, islamitas e judeus. Ao lado deste santuário fica a mesquita de Al-Aqsa, mandada construir pelo segundo califa Omar no século VIII.
— A poucas centenas de metros fica, por sua vez, um dos lugares mais sagrados para os cristãos, a Basílica do Santo Sepulcro, construída no local onde se pensa que Jesus Cristo foi crucificado e, depois, sepultado, para ressuscitar ao terceiro dia.
Este pedaço de Jerusalém, que não é maior do que um campo de futebol, sendo uma irrefutável demonstração factual de convergência espiritual, poderia ser também um símbolo ecuménico de união, irmandade e paz. Infelizmente, não é assim.
O actual conflito israelo-palestiniano tem as suas raízes no século XIX, quando surgiu o movimento sionista a reivindicar o direito do povo judeu a uma pátria, que seria o território da Palestina, por ter sido ocupado por eles até à sua expulsão pelos romanos no século III d.C., e de que resultou a sua dispersão pelo mundo. Com a desintegração do Império Otomano na I Guerra Mundial, criou-se um vazio de poder no Médio Oriente que levaria aos primeiros confrontos entre árabes e nacionalistas sionistas.
Após a II Guerra Mundial e o Holocausto, aumentou a pressão pelo estabelecimento de um Estado judeu. A Organização das Nações Unidas (ONU) definiu, em 1947, o chamado Plano de Partilha da Palestina e estabeleceu um Estado duplo entre Israel e Palestina. Aproximadamente metade do território seria ocupada por cada povo, e Jerusalém, a capital, ficaria sob uma administração internacional. Este plano foi gizado sem qualquer consulta aos palestinianos, tal como, durante 1884 e 1885, na Conferência de Berlim, os representantes europeus dividiram África entre si, ignorando absolutamente os povos e nações que lá viviam. Mas Israel também não aceitou o plano da ONU e declarou unilateralmente independência em 14 de Maio de 1948. No dia seguinte, Egipto, Jordânia, Síria e Iraque invadiram o território. Foi a primeira guerra israelo-árabe.
Depois deste confronto, o território originalmente previsto pela ONU para o Estado Palestiniano foi reduzido a metade com a ocupação da Palestina pelos israelitas, perante a complacência pusilânime da comunidade internacional. E essa condescendência manteve-se em 1967, na Guerra dos Seis Dias, de que resultaram 350 000 refugiados; na Guerra do Yom Kippur, em 1973, quando os países árabes derrotados na Guerra dos Seis Dias tentaram reaver os seus territórios; num dos maiores massacres perpetrados por Israel, quando o povo palestiniano atacou com paus e pedras os tanques judeus, no auge da Primeira Intifada, em 1987; em 2000, no início da Segunda Intifada, quando os israelitas, além de demolirem casas de palestinianos, iniciaram, em 2002, a construção do Muro da Cisjordânia ou Muro de Israel; nos confrontos de 2014, quando cerca de 65 soldados israelitas foram mortos, contra mais de duas mil baixas de palestinianos, combatentes e civis; e em todo um sem número de atentados, assassinatos, agressões e violações de direitos humanos. Entretanto, Israel mantém uma descarada e ilegal política colonialista com a ocupação da Cisjordânia, dos Montes Golã e de Jerusalém Oriental. Por outro lado, há mais de 10 milhões de refugiados palestinianos que reclamam o direito de regressar ao seu território colonizado por Israel.
Os acontecimentos de 2014 marcaram uma viragem clara na percepção internacional do conflito israelo-palestiniano, pois muitos países passaram, finalmente, a questionar a actuação de Israel na região. Esta tendência confirmou-se recentemente com a rejeição esmagadora na ONU da alteração de estatuto de Jerusalém, anulando a declaração norte-americana de que a cidade toda seria a capital de Israel.
No centro da discórdia está sempre Jerusalém. Israel reivindica soberania sobre a cidade inteira que considera que é a sua capital “eterna e indivisível”, por isso a ocupou em 1967, e tanto a Autoridade Palestiniana, que governa a Cisjordânia, como o grupo Hamas, em Gaza, reivindicam a parte oriental como a capital de um futuro Estado Palestiniano. A paz nunca será possível sem se resolver este ponto. E o problema não é encontrar uma solução, pois a solução, a óbvia partilha de Jerusalém e da Palestina, está há muito definida. O problema é encontrar protagonistas para essa solução.
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