Oier Gómez Mielgo cumpria uma pena da prisão de quinze anos em França por, a 9 abril de 2011, ter disparado contra a polícia, ferindo um agente num ombro, para escapar de uma perseguição, tendo roubado um carro, na companhia de outra etarra, Itziar Moreno Martínez. Não foram longe, tendo sido apanhados no dia seguinte.
Tinha também pendentes três mandados de detenção de Espanha e Portugal, mas é colocado em liberdade por sofrer um cancro terminal, com os médicos a não lhe darem mais seis meses de vida, segundo confirmou um especialista oncologista.
O Tribunal de Recurso de Paris aceitou o pedido da defesa do etarra, atualmente com 34 anos, para transferi-lo de um hospital de Paris, onde está internado desde fevereiro, para outro estabelecimento de saúde próximo da sua família, em princípio o de Baiona, no Sul de França, perto da fronteira com Espanha, integrada na região histórica do País Basco do Norte. A única condição é que comunique eventual mudança de localização.
O mandado de detenção internacional emitido por Portugal, para Oier Gómez responder em tribunal pelo arsenal de explosivos encontrados em Óbidos, foi anulado pela justiça francesa, e o mesmo aconteceu com os dois mandados emitidos por Espanha para julgá-lo por ações terroristas.
Os juízes franceses concordaram com os argumentos de Oier Gómez para a suspensão da pena: doença terminal, nenhum risco de reincidência devido ao estado de saúde, bem como a situação política atual, com a ETA a ter abdicado da luta armada em 2011 e, desde 8 de abril, em processo de desarmamento.
“Os dias do meu cliente estão contados”, manifestou a sua advogada, Xantiana Cachenaut, congratulando-se pela decisão de libertação para que “possa partilhar os últimos momentos da vida com os seus entes queridos” e que recolheu “um consenso da instituição judicial”.
Pai de um menino com um ano, Oier Gómez sofre de sarcoma de Ewing, tumor ósseo maligno, que já atingiu a cabeça e a pélvis. A sua primeira condenação, aos 17 anos, foi por colocar um explosivo sob um carro, em 2001.
O segundo etarra que estava na casa em Óbidos, Andoni Zengotitabengoa Fernandez, atualmente com 38 anos, foi preso em Portugal e condenado a doze anos, que cumpre na cadeia de alta segurança de Monsanto.
As movimentações na vivenda, que transformaram numa “fábrica” de bombas, onde as autoridades policiais encontraram 1500 quilos de explosivos, foram descobertas por mera casualidade, na sequência de uma operação “Stop” de rotina da GNR.
Estavam em Óbidos desde 19 de outubro de 2009, altura em que se instalaram na residência do Casal da Avarela. A 1 de novembro, Oier Gómez celebra o contrato de arrendamento com uma empresa imobiliária das Caldas da Rainha e apresenta um documento de identificação falso, em nome de Ernesto Erasmo. Naquela vivenda, os arguidos armazenaram elevadas quantidades de produtos e objetos destinados à fabricação de artefactos explosivos.
No dia 1 de fevereiro de 2010, quando circulavam pela estrada municipal 1408, no Bairro da Senhora da Luz, em Óbidos, numa carrinha roubada em Castelo Branco, a qual não tinha chapa de matrícula na parte da frente e na traseira tinha a matrícula falsa, foram mandados parar por uma patrulha da GNR de Óbidos, no âmbito de uma operação de fiscalização.
Oier Gómez, em vez de parar a viatura, imprimiu-lhe velocidade. O carro foi na direção do na altura comandante da GNR de Óbidos, sargento Carlos Codinha, que teve de se desviar para não ser atingido. Acabaram por abandonar o veículo na Rua Joaquim Claudino Ferreira, no Bairro das Morenas, nas Caldas da Rainha, local onde veio a ser recuperado pela GNR no mesmo dia. No interior da viatura encontravam-se vários objetos relacionados com a atividade terrorista: uma caixa com dois detonadores elétricos destinados a serem utilizados na ignição de explosivos, uma pá, uma picareta, rolos de fita adesiva, luvas, gorros, chapas de matrícula e documentos de carros que tinham roubado. Também um talão de compras do Bricomarché das Caldas da Rainha, que permitiu às autoridades recolher as imagens da videovigilância para confirmar a identidade de Andoni Fernandez.
Os dois elementos da ETA, depois da fuga à GNR, foram rapidamente à residência no Casal da Avarela recolher algum material e abandonaram-na de seguida, deixando as portas abertas, o que chamou a atenção da vizinhança. A GNR, contactada para averiguar o que se passava, acabaria por relatar à Unidade Nacional Contra-Terrorismo da Polícia Judiciária, no dia 4 de fevereiro, de que havia sido encontrada no interior da residência uma grande quantidade de materiais suspeitos de serem explosivos, conforme era possível visualizar a partir do exterior. Na sequência de busca domiciliária, constatou-se que a vivenda “constituía um impressionante pólo de apoio logístico da ETA”.
Ali estavam “engenhos explosivos artesanais de grandes dimensões, prontos a serem utilizados em atentados bombistas em larga escala”, nomeadamente, cerca de 1500 quilos de produto explosivo, folhas com fórmulas de fabrico artesanal de cargas explosivas, ferramentas especializadas e utensílios laboratoriais apropriados, temporizadores com sensores de movimento, desenhos de esquemas eletrónicos e detonadores. Numa máquina fotográfica havia fotos de experiências químicas e rebentamentos, tendo também sido apreendidos canhões de ignição para automóveis da marca Citroen, material informático, telemóveis e diversa documentação falsa.
Andoni Fernandes seria capturado a 11 de março de 2010, quando tentava fugir de Portugal para a Venezuela, usando uma identidade falsa – apresentava-se como Juan Rodrigues Espinal, de nacionalidade mexicana. Foi apanhado pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras no aeroporto de Lisboa, tendo sido detetado pelo passaporte, que o dava como tendo mais doze anos do que a idade verdadeira. Foi-lhe apreendida documentação diversa falsificada, material informático e um disco rígido onde tinha filmes que exemplificavam o processo de produção de pentrita (substância utilizada para potenciar deflagrações), de engenhos explosivos e de falsificação de documentos de identificação.
Desde 1968, a ETA foi responsabilizada pela morte de mais de 800 pessoas e por ferimentos causados a milhares de outras, além de dezenas de sequestros. Estima-se que mais de 400 membros da ETA estejam em prisões da Espanha, França e outros países.
A organização reivindicava a zona do nordeste da Espanha e do sudoeste da França, na região montanhosa junto aos Pirenéus, virada para o Golfo de Biscaia, região denominada por Euskal Herria (País Basco). A ETA reivindicava, em território espanhol, a região chamada Hegoalde ou País Basco do Sul, constituído por Álava, Biscaia, Guipúscoa e Navarra; também reivindicava, em território francês, a região chamada Iparralde ou País Basco do Norte, constituído pelos territórios históricos de Labourd, Baixa Navarra e Soule
Em 20 de outubro de 2011 a organização emitiu um comunicado anunciando o fim das suas atividades. O abandono da luta armada pela ETA aconteceu no momento em que a organização estava mais débil, devido ao seu crescente isolamento social no País Basco, pela demarcação progressiva do seu braço político e à pressão policial que, em Espanha e França, destruiu a capacidade operacional dos seus comandos. Apesar do abandono da luta armada, somente em 17 de março de 2017 veio o anúncio do desarmamento “total e sem condições” marcado para uma cerimónia realizada a 8 de abril.
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