As Nações Unidas dizem que, na melhor das hipóteses, haverá dinheiro para apenas 60% dos 343 milhões de pessoas em 74 países que se prevê que irão precisar dessa ajuda ao longo deste ano.
A ONU terminou 2024 angariando apenas 46% dos 50 mil milhões de dólares que estavam previstos para a assistência humanitária, e foi o segundo ano consecutivo em que conseguiu menos de metade do que estava previsto. Estes valores são menos de 10% do orçamento anual da defesa dos Estados Unidos.
O orçamento americano para a defesa passou de 750 mil milhões para 810 mil milhões. Para matar a fome no mundo conseguem-se com muita persistência 50 mil milhões de dólares. Os 60 mil milhões de aumento na defesa somados aos 50 mil milhões da ajuda internacional resolveriam todos os problemas de fome e todos os problemas de água e saneamento, entre outras necessidades básicas.
Havendo cerca de metade do financiamento necessário, há que reduzir o número de pessoas a que se dá a ajuda alimentar, ou seja tira-se a quem tem fome para dar a quem está a morrer de fome.
Os maiores doadores de ajuda internacional são os Estados Unidos, que dão quase 40% do total, seguidos da Alemanha e da Comissão Europeia que doam cerca de 20%. Os objectivos da ajuda internacional são 0,7% do PIB. Mas a média global é de 0,37%. Portugal, em anos mais generosos, dá 0,15% do seu PIB.
Os principais países doadores estão a dar menos por pressões financeiras internas, como nos casos da Alemanha e França, e por haver mais gente a aderir a partidos avessos à ajuda humanitária, mas também por certa “fadiga” da ajuda que não tem evitado que os problemas persistam. E agora muitos dos países que recebem refugiados estão a canalizar para ajuda humanitária interna grande parte dos 0,7%. Ora, é muito mais caro ajudar refugiados em países europeus do que nos países de origem.
O argumento do Programa Alimentar Mundial (PAM) das ONU é que se as pessoas forem ajudadas nos locais de origem, não terão necessidade de migrar para sítios onde custarão 7,5 vezes mais a ajudar.
O Projecto 20-25 (conjunto de políticas de direita conservadora da Heritage Foundation para remodelar o governo dos Estados Unidos) diz que a ajuda humanitária está a sustentar economias de guerra e regimes nefastos, desencorajando os governos de fazerem reformas. Também a complexidade logística para fazer chegar a ajuda a certos lugares e as histórias de roubos desincentivam as doações. Segundo Pedro Matos, coordenador de emergências do PAM, as decisões resultam da análise do equilíbrio entre ser enviada ajuda sem monitorização ou deixar as pessoas morrer, e são tomadas por acordo entre as agências humanitárias e os doadores.
Em Dezembro, em Seul, o Banco Mundial anunciou o maior pacote de sempre de empréstimos e ajudas financeiras para os países mais pobres, no valor de 100 mil milhões de dólares, para os próximos três anos. Mas os maiores doadores entregaram a mesma quantia do pacote anterior, 24 mil milhões de dólares, valor que, ajustado à inflação, foi a contribuição mais baixa deste século. Em países como o Sudão, que tem 25 milhões de pessoas com necessidades e só se abrangem dez milhões, o governo deverá lidar com as outras. Se o governo não tiver dinheiro e não for capaz de se endividar para alimentar todas estas pessoas… Entretanto, cada vez que se faz explodir um míssil, vaporiza-se milhares de dólares, desperdício a somar à inutilidade da destruição, perdas humanas e sofrimento imenso.
Escrevi este texto antes de saber que a USAID foi encerrada. A fome no mundo será muito pior do que aqui se previa.