Joana Louro, internista na Unidade Hospitalar das Caldas da Rainha, e o deputado da Assembleia da República e também ex-bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, que foram os oradores da conferência/debate sobre “O estado da saúde no Oeste”, organizada pelo PSD caldense, foram unânimes que a região precisa urgentemente de um novo hospital e que só faz sentido ser construído no terreno entre Caldas e Óbidos.
O evento, que encheu no passado dia 24 o Café Concerto do Centro Cultural de Congressos das Caldas da Rainha, teve como moderador o deputado caldense Hugo Oliveira e contou também com a participação do presidente da Câmara de Óbidos, Filipe Daniel, que continuam a lutar para que o novo hospital fique no território caldense e obidense.
Foi um debate profícuo com a intervenção do público, mas no final a mensagem principal é que a saúde tem que ser “repensada para responder aos novos desafios e necessidades”.
Joana Louro, que trabalha no hospital das Caldas desde 2007, deixou claro que não é política nem do PSD, mas pensa “muito sobre a saúde, numa visão como caldense e médica hospitalar”.
Disse que a urgência do Hospital das Caldas está desfalcada. Mostrou uma fotografia que foi tirada durante os momentos mais críticos da Covid-19 na unidade, que “não é muito diferente de há dois dias em que fiz urgência nas Caldas com uma equipa completamente desfalcada”.
Deixou bem claro que “não há médico nenhum que faça urgência que goste de ver o seu serviço encerrado”. “É muito importante transmitir que se encerramos, é porque precisamos de assegurar segurança nos cuidados médicos aos doentes que entram”, salientou.
A médica considera que tem que haver “uma mudança de mentalidade porque nós não podemos ter uma urgência e uma maternidade aberta à porta de cada município”. “A patologia da grávida mudou. As mulheres são grávidas muito mais tarde e a exigência do ponto de vista de segurança modificou. São precisos mais médicos para que os partos sejam feitos em segurança”, apontou.
“O Oeste é pequeno e movimentamo-nos bem. Ter a urgência de Caldas e Torres aberta é verdadeiramente insustentável, porque estamos a trabalhar abaixo dos limites de condições de segurança. Serviços que exigem 24 horas abertos são trituradores de pessoas a funcionar com médicos, enfermeiros e assistentes operacionais. Têm de ser muito bem geridos e não é à custa de tarefeiros, tapa-buracos que damos qualidade aos doentes”, afirmou.
Joana Louro afirmou que “não há falta de médicos, mas existe a necessidade de serem dadas melhores condições de trabalho aos profissionais de saúde”, acusando os últimos Governos de “estancar carreiras e apertar salários para que muitos dos médicos, enfermeiros e técnicos não tenham outra opção que não seja ir para fora de Portugal ou ir para o setor privado”.
A médica internista não se mostrou otimista. “Os médicos em geral não estão a ser tratados da forma adequada, tem de haver valorização e respeito pelo nosso trabalho. E os colegas, sobretudo os recém-formados, olham para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) como algo que é pouco atrativo e procuram outras opções”, reconheceu.
Segundo a médica, podemos abrir “todos os concursos e colocar todas as vagas, mas se não tivermos profissionais motivados, os concursos serão um fracasso”.
“Os médicos querem trabalhar e fazer bem o seu trabalho, mas querem também ter a sua vida e isto tem de ser respeitado. Nós não vamos ter profissionais a trabalhar 40 horas seguidas no hospital e serem chamados para fazer mais horas como tínhamos há uns anos atrás”, adiantou.
A saúde hoje “não é como quando foi criado o SNS”, disse a médica, revelando que é preciso repensar tudo desde o princípio porque “tudo é diferente e nós precisamos de uma saúde que seja sustentável até do ponto de vista económico e ambiental”.
Para Joana Louro, é necessário haver verdadeiros programas de promoção de saúde nas escolas.
Referiu ainda que a saúde no Oeste não é só o novo hospital até porque o acesso aos Cuidados de Saúde Primários são fundamentais porque “sem eles nada funciona”. “Eu não dou alta a alguns dos meus doentes porque sei que não têm médico de família e que não vão ser seguidos”, contou, acrescentando que “os cuidados primários têm de ser a porta de entrada no setor de saúde”.
Dando resposta ao antigo presidente Tinta Ferreira, que esteve presente na sessão, Joana Louro disse que não concorda “nada” com localização do novo hospital em Vale Covo, no Bombarral. “Este massacre de tanto tempo para decidir, se forem questionar os profissionais de saúde da unidade das Caldas cerca de 70% estão-se nas tintas para onde é que vai ser o hospital. Eles só querem uma infraestrutura nova”, contou.
Para a médica isto é perigoso porque “o desgaste de um processo muito arrastado pode levar a tomar decisões políticas erradas”.
Joana Louro não teve problema em assumir uma posição porque considera que o hospital tem de servir os utentes e um hospital “desfasado do ponto de vista geográfico, por mais que matematicamente seja o centro, não serve a maioria das pessoas”.
“Um hospital tem de dar resposta do ponto de vista de transporte e de acesso e ainda dar condições às pessoas que lá vão trabalhar”, salientou. “Eu nunca iria escolher trabalhar num sítio que não tenha escolas para as minhas filhas e que não tenha bons serviços para poder viver e conviver”, alertou, revelando que “em Vale Covo nós não cativamos nem uma joaninha quando mais um principezinho”.
A médica avisou ainda que esta altura é a melhor para atrair médicos mais jovens porque viver em Lisboa é “absolutamente incomportável”. “Pagar alojamento em Lisboa, pagar creches e escolas é neste momento insuportável e isto é uma janela de oportunidade para o Oeste, que está muito próximo da capital”, sublinhou.
“A saúde tem que ser repensada”
O médico Miguel Guimarães, que é deputado do PSD, disse que recentemente viu uma entrevista dada pela Secretária de Estado da Gestão da Saúde que declarou que “iria haver uma reavaliação sobre a localização do novo hospital para tomar uma decisão definitiva sobre essa questão”.
“Tenho informação que esta é uma das prioridades para o governo e por isso há que ter esperança e que possa responder àquilo que a população do Oeste precisa, que é o acesso aos cuidados de saúde”, referiu.
Quanto ao anúncio do antigo ministro da Saúde, Manuel Pizarro, sobre o novo hospital do Oeste ser no Bombarral, o ex-bastonário manifestou que nem “sequer cumpria os instrumentos do ordenamento do território e só isso era suficiente para poder chumbar o governo da altura”.
Miguel Guimarães destacou Hugo Oliveira, que é um “excelente embaixador das Caldas da Rainha na Assembleia da República, que não vai deixar esquecer a importância que este hospital tem no desenvolvimento desta cidade”. “Obviamente que será o governo a decidir e Caldas poderá ainda ser uma possibilidade para a nova unidade”, revelou.
O deputado referiu que está mais do que provado que Portugal tem os “médicos suficientes, só que não estão no SNS”. “Temos cerca de 1.700 médicos de família fora do SNS que daria para atribuir médico de família às pessoas que ainda não têm”, apontou.
O parlamentar considera que “a ministra da Saúde deveria priorizar idosos, crianças e pessoas mais frágeis que não tenham médico de família”. Aconselhou ainda a revisão das Unidades Locais de Saúde.
O deputado disse que a prevenção da saúde é fundamental para que daqui a quinze ou vinte anos tenhamos mais pessoas saudáveis e que a saúde seja mais sustentável. Defendeu a criação de um instituto independente nessa área que tenha cerca de 3,5% do orçamento de Estado para se fazer ações de promoção.
Filipe Daniel, presidente da Câmara de Óbidos, mostrou a sua preocupação com a falta de médicos de família, revelando que “para quem tem um território com 82% de utentes sem cuidados e uma médica que já apresentou os papéis para a reforma, portanto, estou em risco de ficar com 100% de utentes sem médico de família”. “Óbidos tem estado a crescer do ponto de vista demográfico e os fluxos migratórios estão a ocupar o nosso território, daí a necessidade de termos mais respostas na área da saúde”, apontou.
O autarca também abordou a nova unidade, referindo que o terreno onde foi anunciada a nova localização para o hospital tem “imensas condicionantes”.
“Eu percebo naturalmente aquilo que era a posição do anterior governo em tentar fazer alguma coisa pelo Bombarral, que tem estado estagnado e era o único argumento. Não há qualquer comparação com a localização que está prevista entre Óbidos e Caldas, que está perto da ferrovia”, salientou.
Hugo Oliveira encerrou a conferência referindo que a saúde no Oeste “está doente e é preciso agir porque é o pilar de uma sociedade”.
0 Comentários