Tema de tertúlia da ACCCRO
As empresas do setor da saúde têm um papel essencial de complementaridade para com o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e nas Caldas da Rainha existe uma grande panóplia de serviços que cresceram à volta do hospital público.
Estas foram as ideias centrais defendidas pelos oradores de mais uma tertúlia organizada pela Associação Empresarial das Caldas da Rainha e Oeste (ACCCRO), no âmbito das comemorações dos seus 120 anos, a qual teve lugar a 29 de julho.
A ACCCRO convidou vários caldenses com negócios ligados ao setor da saúde, desde lojas de ótica e farmácias ao Montepio Rainha D. Leonor, para abordar a temática de uma forma mais alargada.
A conversa, moderada pelo jornalista Francisco Gomes, teve lugar nos jardins do Museu da Cerâmica, durante duas horas e pode ser visionada na página de Facebook da associação empresarial.
O presidente da ACCCRO, Luís Gomes, destacou a importância deste setor na economia das Caldas da Rainha e da região. O tema já estava decidido ser discutido desde o início do ano, mas tornou-se ainda mais relevante perante a decisão do ministério da Saúde sobre a localização do futuro hospital do Oeste.
O presidente da Câmara das Caldas, Vitor Marques, considera que o SNS nem sempre dá resposta às necessidades das pessoas e por isso é necessária a complementaridade do setor privado.
Segundo o autarca, o município tem uma intervenção na área da prevenção e da promoção de estilos de vida saudáveis, com destaque para a atividade física. Existe a intenção de dinamizar aulas de educação física para os alunos do 1º Ciclo do concelho, assim como de natação. Há ainda uma aposta na Saúde Mental, tendo o município contratado duas psicólogas
O edil caldense lembrou ainda que a autarquia tem apoiado sempre o hospital das Caldas, que serve uma população muito mais abrangente do que o concelho. Por exemplo, a Câmara comparticipa com 725 mil euros as obras de requalificação da maternidade do CHO.
Caldas tem tido esse papel agregador de toda a região e não é por acaso que existam mais alunos nas escolas do concelho do que crianças que habitam neste ou mais utentes nos centros de saúde do que população.
Setor privado tem várias vertentes e muito díspares
Paulo Freire, farmacêutico e sócio-gerente da Farmácia Neto, salientou que, segundo dados de 2021, 50% da população portuguesa tem uma “segunda cobertura” para além do SNS, ou seja, com seguros de saúde ou subsistemas públicos.
No entanto, Francisco Rita, presidente do conselho de administração do Montepio Rainha Dona Leonor, sublinhou que o que a maioria das pessoas tem é um plano de descontos e não um verdadeiro seguro de saúde que garanta assistência médica ao longo de toda a sua vida. Há doenças graves cujos custos de tratamento excedem em pouco tempo o “plafond” atribuído nos planos de saúde e depois é necessário recorrer ao SNS.
Na sua intervenção, Paulo Freire destacou também que existe uma diferença entre as empresas que têm convenções com o SNS, como as farmácias e os laboratórios e as que não têm (hospitais privados de grandes grupos). Na sua opinião, as farmácias acabam por fazer parte do SNS.
Embora defenda que exista um hospital privado nas Caldas, o farmacêutico acha muito mais importante que continue a existir um público. Em relação ao novo hospital do Oeste, Paulo Freire considera que a única hipótese de a decisão ser revertida é que todos se unam “nesta luta”.
Para Paulo Freire existe atualmente um grande interesse por parte do setor privado em expandir-se e por isso aparecem tantas notícias sobre os problemas no SNS. “Na verdade, não está assim tão mal como dizem”, considera, sendo necessário pensar mais na forma de reter médicos, enfermeiros e farmacêuticos. O que é difícil de acontecer quando noutros países europeus estas profissões são muito melhor renumeradas. Por isso, defende que se investa muito mais no SNS e menos “em autoestradas e aeroportos”.
Francisco Rita aproveitou a ocasião para apresentar algumas novidades relativas a esta instituição “que está a passar por uma fase de rejuvenescimento”.
Para além de estar a melhorar as condições existentes no atual edifício, vai em breve apresentar ao presidente da Câmara das Caldas o projeto para um novo hospital, no edifício da antiga EDP. “Temos que olhar para o futuro tendo como referência o passado”, afirmou.
O responsável salientou que a saúde não tem só a ver com hospitais, mas também com uma série de outras valências e que começa com o cuidado que cada um deve ter consigo próprio.
Francisco Rita referiu que nas últimas décadas a população ativa e o número de nascimentos tem diminuído no concelho, ao mesmo tempo que aumentam os idosos. “Isso trouxe uma carga acrescida aos serviços de saúde”, afirmou.
Outro problema é a falta de médicos, algo que também afeta o Montepio e outras instituições privadas, não só o serviço público.
No entanto, para Francisco Rita o SNS tem uma dificuldade grave na forma como é gerida toda a informação e, por isso, são tomadas decisões com base em dados errados.
Da prevenção ao acompanhamento personalizado
Pedro Simão, CEO do grupo Balance Company, salientou que o seu trabalho no setor da saúde está na área da prevenção, ao promover a atividade física de uma forma orientada. “Entendemos que a saúde deve ser pensada de uma forma integrada e os nossos espaços estão preparados nessa visão”, afirmou.
O empresário referiu que Portugal está na cauda da Europa em relação à atividade física, uma vez que os portugueses são muito sedentários. “Há um problema na promoção da atividade física no seio das famílias, mas também nas escolas”, considera.
Segundo Pedro Simão, nas Caldas da Rainha existe o maior índice de atividade física do país em ginásio (20%), com cinco mil pessoas a praticarem diariamente.
A psicóloga Sara Malhoa, que tem consultório aberto nas Caldas e também acompanha atletas de alto rendimento na Escola Superior do Desporto (Rio Maior), referiu que depois dos confinamentos devido à Covid-19, houve uma maior vontade por parte das pessoas em terem algum tipo de atividade física. Isso também aconteceu em relação à saúde mental, com mais procura de consultas na ótica da prevenção.
Segundo a psicóloga, a área da saúde mental tem muita procura no setor privado porque não existe resposta suficiente no SNS. “Se formos a um centro de saúde com uma situação urgente, atualmente demoramos seis meses a ter uma consulta de saúde mental”, adiantou.
Marco da Silva Paulo, proprietário de uma clínica bioquântica, também considera que tudo mudou a seguir à pandemia, com as pessoas a ficarem mais sensibilizadas para a saúde. “Na medicina quântica a mudança é obrigatória, seja na alimentação, no plano de exercícios, entre outras”, adiantou.
O terapeuta, que já viveu no estrangeiro, quis estabelecer-se nas Caldas da Rainha por ser o local onde se sente bem e considera que a cidade tem um grande valor. “A sua dimensão é muito maior do que a cidade em si”, afirmou.
Cristina Ferreira Gomes, diretora técnica da clínica Lumilabo, contou que foi aberta uma delegação nas Caldas da Rainha, no seguimento do trabalho que realizaram nas análises relativas à Covid-19. No entanto, os resultados não são tão positivos como esperava porque existia já muita oferta nesta área na cidade.
“Pensávamos que as pessoas passassem a preocupar-se mais com a sua saúde, por se aperceberem da fragilidade que temos”, comentou Cristina Ferreira Gomes, acrescentando que as análises clínicas são essenciais para uma abordagem preventiva.
Também nesta área o SNS não tem capacidade de resposta para toda a população e por isso recorre ao setor privado, através de convenções. Por outro lado, Cristina Ferreira Gomes destacou ainda que os laboratórios privados são mais céleres a apresentar os resultados das análises e têm uma abordagem mais pessoal.
Para Mafalda Caxaria, proprietária da Ortopedia Passo Real, o encerramento do hospital das Caldas para abrir um novo no Bombarral vai influenciar muito todos os negócios ligados à saúde que existem nesta cidade. “Há muitos clientes que temos porque vêm ao hospital das Caldas e assim vão deixar de vir”, referiu.
A sua empresa fornece também hospitais públicos, no entanto, considera que é mais fácil contatar um médico do setor privado do que do SNS, quando existem dúvidas relativas a uma receita para um aparelho ortopédico. “Mas compreendo que o setor público está sobrecarregado”, afirmou.
A caldense Teresa Dinis, diretora técnica da Farmácia d’Aldeia, contou como é fascinante trabalhar num estabelecimento onde estão em contato direto com a população. “Somos os primeiros a quem os utentes recorrem”, salientou.
Para além da venda, prestam serviços como entrega ao domicílio, acompanhamento dos utentes ou preparação da medicação, entre outros. “Estamos numa pequena aldeia e eu conheço todas as pessoas”, referiu. Tal como noutras zonas do país, um dos principais problemas é a falta de médicos de família e por isso o apoio que dão é muito importante.
Sandra Correia, gerente da óptica Ergovisão das Caldas da Rainha, destacou que o foco do seu trabalho é a qualidade no serviço que é prestado neste estabelecimento. “Diariamente detetamos muitas patologias e encaminhamos os utentes para a área de oftalmologia, sempre que achamos necessário”, referiu. “Não estamos apenas interessados em fazer vendas”, disse, lamentando que muitas vezes há uma desvalorização da área da oftalmologia por parte das pessoas.
Segundo a empresária, “pela minha experiência, muitas pessoas procuram soluções no privado devido à incapacidade que o SNS tem em dar resposta”. Pelo acompanhamento que fazem de vários clientes, tem noção de que no privado tudo funciona mais rapidamente.
Para Cassis Clay, CEO e diretor clínico do grupo Oralplan, estar na área da saúde é um grande desafio, mas ter criado a sua empresa foi o realizar de um sonho. Na sua opinião, neste setor é preciso estar sempre atualizado e saber comunicar os serviços que prestam. O grupo aposta muito também na formação dos seus profissionais. Por exemplo, uma tarde por semana a clínica encerra para ações de formação.
O médico lamentou que uma grande parte da população portuguesa não tenha acesso a tratamentos dentários. Nesta área o SNS tem ainda menos capacidade de resposta.
O tema da próxima tertúlia, em agosto, será “A Importância dos Municípios no desenvolvimento do comércio das cidades”.
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