O populista sabe convencer o eleitor, isto é, sabe como enganá-lo e conquistá-lo. Esta manha é comum a todo o político, mas o populista apenas se apresenta empático, não tendo preocupações com o interesse público nem lhe interessando o bem comum. Muitas vezes é um criminoso convicto e os crimes são conhecidos, mas até isso é um argumento encantatório — por cá, diz-se «rouba, mas faz».
Para o populista, os eleitores podem ser feios, porcos e maus, deploráveis até, que demonstra sempre gostar deles. É exímio a gerar pertença no eleitorado que se sente abandonado, dizendo o que for preciso para ir ao encontro dos ressabiados, mal informados e mal formados desta vida.
Esta fórmula tem sucesso pleno quando aproveita os mass media — que agora incluem as redes sociais — para fazer passar por realidade o que é só percepção, e respaldar o preconceito e a mesquinhez individuais.
Aponta-se Berlusconi como o precursor deste tipo de figura carismática sem vergonha, depois ampliada por Trump e pelo seu abandalhamento sistemático do discurso político, e por uma praga de epitomes que alastra em todas as democracias. Por cá, temos Ventura, que se faz aclamar como o representante de Deus na política.
Quem gosta de proferir atoardas de cariz racista, xenófobo, homofóbico, ou com qualquer outro enviesamento maldoso, não consulta a Segurança Social (SS) nem o Observatório das Migrações nem o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) nem outras instituições idóneas. Ou consulta, para calibrar a mentira em função do público-alvo.
Os nossos populistas eleitos vão para a Assembleia da República (AR) vociferar que os imigrantes entram em Portugal «de qualquer maneira, para usar os nossos bens públicos». Ora, para quem quiser saber, a SS informa que há 660 mil estrangeiros legais em Portugal que contribuem com 13% para o excedente de 4000 milhões de euros, o maior em mais de um decénio, do sistema da Segurança Social. Estas contribuições são pagas por 9916 bangladeshianos, 46.239 britânicos, 21.015 nepaleses, 16.981 espanhóis, 95.122 cidadãos dos Países de Língua Oficial Portuguesa, 6381 paquistaneses e 28.629 ucranianos.
O Observatório das Migrações mostra que os imigrantes dão muito mais do que recebem do Estado português. Entre o que estes estrangeiros pagaram ao Estado e o que receberam do Estado, o saldo foi de 968 milhões de euros de lucro para o país. É claro que estes dados não convêm ao discurso populista.
Os nossos populistas eleitos também vão bramar para a AR que «a imigração faz aumentar o crime» e que «é preciso debater o problema da segurança». Segundo o Global Peace Index 2022, Portugal é um dos países mais seguros do mundo. Encontra-se em sétimo lugar, a seguir à Islândia, Dinamarca, Irlanda, Nova Zelândia, Áustria e Singapura. A Alemanha está em 15º, os Estados Unidos em 131º e o Brasil em 132º, por exemplo. Mas aos populistas dá jeito afirmar que vivemos num país inseguro.
Os nossos populistas eleitos também gostam de ir para a AR dizer que «os imigrantes roubam os nossos postos de trabalho». Segundo o IEFP, mais de 50% dos estrangeiros que trabalham em Portugal fazem trabalhos pouco qualificados, por oposição a 38% dos portugueses, trabalhos que muitos portugueses, mesmo estando desempregados, não querem ou não conseguem fazer.
Os nossos populistas eleitos também atraem votos com a conversa dos “verdadeiros” portugueses, pessoas de bem, povo santo, trabalhador e honesto, contra os bandidos dos imigrantes e a elite corrupta que está toda nos outros partidos. E tem-se visto que quem gosta desta conversa, o povo santo que bem sabe da sua santidade, vota para ver até onde os populistas assim eleitos são capazes de levar tal fantasia.
Como diria o recentemente relembrado Guerra Junqueiro, tudo gente de vista baixa, moralmente ordinária e intelectualmente reles.
Escrevo segundo a anterior grafia.
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