São pouco mais de 60 páginas, mas o livro “História do Teatro nas Caldas da Rainha”, apresentado no passado sábado, é um importante documento histórico sobre a atividade cultural desta cidade.
A apresentação deste livro, que contou com o apoio do município das Caldas da Rainha, teve lugar no museu do Ciclismo, local onde estão expostas muitas fotografias, além de outros elementos, dos antigos teatros e salas de cinema caldenses. É exatamente uma fotografia das ruínas do teatro Pinheiro Chagas logo após este ser demolido, da autoria de Valter Vinagre, que ilustra a capa desta publicação.
O autor, Mário Tavares, foi bastante modesto no subtítulo da obra, tendo em conta a densidade da informação revelada, chamando-lhe um contributo e no final do livro deixa o desafio para que outras pessoas possam prosseguir esta investigação.
A apresentação do livro esteve a cargo de Manuel Gil, que destacou a longa obra de Mário Tavares sobre a história das Caldas da Rainha. Amante de teatro, e também ator, Manuel Gil disse ter ficado deslumbrado com o que descobriu neste livro sobre o que se fez durante século XIX nas Caldas. “Nem sabia que tinha havido tantas salas de teatro nesta cidade, embora fossem pequenas”, disse.
A história do teatro nas Caldas da Rainha começou a 6 de junho de 1504, quando Gil Vicente apresentou o seu Auto de São Martinho à Rainha D. Leonor, na capela do hospital de Senhora do Pópulo.
Este foi assim o primeiro acontecimento cultural a ter lugar nesta povoação, no final da procissão de Corpus Christi. De acordo com o historiador Teófilo Braga, o próprio Gil deverá ter tido o papel do pobre nesta encenação.
O livro surge na sequência de uma investigação realizada por Mário Tavares para a realização de um texto sobre o tema, pedido pelo então vereador Jorge Mangorrinha, em 2005, para o boletim “Cidade Termal, que era publicado pela Câmara das Caldas.
O autor quis depois alargar a sua investigação e complementar a história que já tinha escrito, com mais informações, algumas delas inéditas. “Foi muito difícil fazer uma investigação sobre este tema, só é mesmo possível através dos jornais antigos”, revelou. Só no livro “Catálogo de Bilhetes Postais Ilustrados”, de Vasco Trancoso, é que conseguiu recolher muito material escrito que conseguiu utilizar.
O livro está dividido em cinco atos, tal como uma peça de teatro. De Gil Vicente, ao grupo profissional Teatro da Rainha e ao curso de teatro da ESAD.CR.
No prólogo, Mário Tavares refere os sentimentos que existiam em Óbidos, à época da formação de uma nova povoação – Caldas da Rainha “e à demarcação do seu Termo, por D. João II, por solicitação da esposa, D. Leonor. A terra viria a ser considerada como vila a 21 de março de 1511, quando já reinava D. Manuel I, irmão da rainha, “por subtração territorial ao concelho vizinho”.
Data dessa altura o texto “a lamentação do velho Óbidos”, da autoria de Anrique da Mota, natural do Bombarral, que é um dos poetas mais conhecidos do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende (1516).
É também da autoria de Anrique da Mota a Farsa do Hortelão (sobre a avareza do então Provedor das Caldas) que viria a ser apresentada pelo Teatro da Rainha em 1984.
O primeiro ato do livro refere-se à criação da Sociedade Dramática Caldense, logo depois do triunfo da monarquia liberal, em 1834. “Anteriormente dificilmente haveria condições para haver grupos de teatro amadores”, comentou Mário Tavares. Este será, aliás, o exemplo mais antigo da vida associativa local.
Esta sociedade construiu o seu próprio teatro na agora Rua de Camões, o qual viria a ser demolido na década de 80 do século XX, por ordem de Rodrigo Berquó.
Depois de terem aberto outras salas, acabariam por avançar para a construção do Teatro Pinheiro Chagas, concluído em 1902 e que viria a ser também demolido por vontade do então presidente da Câmara, Fernando Costa, nos anos 80 do século passado.
O livro faz uma descrição alongada da atividade daquele espaço cultural, onde foram apresentadas inúmeras peças de teatro.
Entre os anos 50 e a revolução de 1974, surgiu o Centro Cultural Cénico (CCC). “Numa altura em que se considerava que o teatro era um veículo cultural que iria abrir a cabeça das pessoas”, explicou Mário Tavares, que foi um dos fundadores do CCC.
Em relação ao CCC, Manuel Gil destacou que nessa altura pouco era feito ao nível do teatro amador no país, fora dos grandes centros urbanos. “Temos de ter muito orgulho por Caldas da Rainha ter esse património”, sublinhou.
Depois da revolução tudo se altera e “as pessoas dividem-se, acabando o tempo de projetos como o CCC”, comentou Mário Tavares. O CCC terminou a sua atividade em 1976.
Surge então Teatro da Rainha, uma companhia profissional que em breve irá celebrar os seus 40 anos e que Mário Tavares também assinala a importância para a região e para o país.
“Este é o meu contributo para uma cidade que não olha muito para trás e que é prejudicada por, por vezes, não evocar o seu passado”, disse ao JORNAL DAS CALDAS. Manuel Gil também gostaria que deveria ser feita uma investigação do que aconteceu em relação ao teatro entre a exibição da peça de Gil Vicente e o século XIX.
Na apresentação do livro, o presidente da Câmara das Caldas, Vitor Marques, destacou que “é a nossa história que nos distingue dos outros”, elogiando o trabalho feito por Mário Tavares.
As receitas angariadas pela venda deste livro revertem para a associação De Volta a Casa, de Joaquim Sá.
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