Escaparate
Durante o meu mandato como deputado da Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Caldas da Rainha – N. S. do Pópulo, Coto e São Gregório (2017-2021) por diversas vezes – especialmente no primeiro ano – solicitei que aquele órgão tivesse uma atenção extrema para com os monumentos da freguesia (os mais importantes e imponentes de todo o concelho estão ali instalados) – nomeadamente as estátuas, hermas e bustos que homenageiam as personalidades que são caras à terra – providenciando a sua imediata restauração.
Custa-me andar pelas artérias desta freguesia, bem como pelo Parque D. Carlos I, e perceber que nada foi feito para recuperar aquele degradado património.
Para eventos onde a aglomeração popular pode representar votos futuros gastam-se milhares de euros, porém, para essa fatia cultural, tão importante para o turismo e para o desenvolvimento pleno da personalidade de cada um, não há um cêntimo sequer.
Vemos, tristemente, a estátua da Rainha D. Leonor, o busto de Rafael Bordalo Pinheiro, o monumento a Raul Proença, etc., num estado tão lastimável de conservação que passamos a ter certeza absoluta de que a vereação da cultura serve apenas de pavoneamento para a titular da pasta. E que os “avanços” nessa mesma cultura são apenas engodos para a fotografia da praxe.
É notório que os caldenses dão pouca importância aos seus monumentos, mas são capazes de, em outras cidades, ou países, de passar uma parte das férias a fotografar – e a babarem-se – diante de um qualquer espécime estatutário local.
Atravessarem os dias não demonstrando preocupação com a memória das Caldas da Rainha não me espanta, porém preocupa-me, pois, o que está aqui em jogo é a manutenção dos padrões culturais do concelho, tanto para as gerações atuais como futuras. As estátuas, hermas e bustos, por exemplo, mantém vivo o passado e a sua relevância é imensa para toda a sociedade, estabelecendo e perpetuando diversas identidades transtemporais. A Antropologia, quando se refere à estatutária, explica-nos com rigor e detalhe todas as particularidades e nuances desse pensamento.
A política caldense possui uma relação emocionalmente pobre em relação ao seu património artístico, preocupam-se com a criação, porém, desprezam a conservação.
Nos restantes três anos do mandato voltei a insistir com aquela União de Freguesias, sem resultados.
Em 2018 publiquei nestas páginas (Calisto, Rui. “A estatuária urbana das Caldas da Rainha”. In.: Jornal das Caldas. Caldas da Rainha, ano XXVI, no 1353, 11 de abril de 2018, Escaparate, Opinião, p.29), um artigo que não sensibilizou ou motivou os organismos autárquicos, e os monumentos permaneceram no lastimável estado que se vê.
Repetindo o que disse naquela publicação: A recuperação, manutenção e vistoria regular de cada monumento, garantirá a valorização das Caldas da Rainha como Cidade das Artes. Enriquecendo, inevitavelmente, a cultura popular, o conhecimento pela história e pela memória local, funcionando, inclusive, como um elemento educativo e civilizacional, indo até ao ponto de definir identidades.
Já Albert Camus (1913-1960), sabiamente, diz-nos que: “Sem a cultura, e a liberdade relativa que ela pressupõe, a sociedade, por mais perfeita que seja, não passa de uma selva. É por isso que toda a criação autêntica é um dom para o futuro”.
Os monumentos, instalados em zona pública, são o reflexo cultural de um povo e de uma autarquia. O que se vê nas Caldas da Rainha – obras de arte imundas, degradadas e abandonadas – reflete a qualidade cultural dessa população e da sua classe política, o que torna esta urbe pouco apetecível ao turismo e ao investimento económico.
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