Escaparate
Em tempos existiu, no Parque D. Carlos I, em Caldas da Rainha, um monumento em homenagem ao grande romancista português cujo nome segue em epígrafe. A peça encontrava-se nas proximidades do Pavilhão Rainha D. Leonor (Casa dos Barcos) e, neste momento, não há santo que a encontre.
Tratando-se de um busto, uma herma, um quadro, até compreenderia que algum “amigo do alheio” tivesse surripiado a peça, para depois “passá-la nos cobres”, mas um monumento com aquelas medidas não poderia ser levado às costas. O que me faz crer que o mesmo foi, em tempos, retirado pela autarquia, ou por outro órgão público.
Acerca do cadastro da peça: Existe um registo fotográfico (um cartão-postal da década de 50, do século XX), porém, não há nenhuma ficha de inventário, rúbrica legível, auto de colocação e de retirada, e ato de depósito em outro local, o que pode tornar praticamente impossível a tentativa de a localizar.
Aguardo (sem paciência nenhuma) que a nova vereadora da Cultura de Caldas da Rainha tome providências, no sentido de encontrar o monumento em questão (a prezada senhora nunca deve ter ouvido falar na existência do mesmo). No final do ano, caso a peça não tenha sido restituída ao seu lugar de origem (o Parque Dom Carlos I) tratarei do envio de um relatório ao respetivo Ministério, para que este possa encaminhar o assunto para a Procuradoria-Geral da República, dando, assim, conhecimento do facto às altas instâncias da nação.
Como acredito na boa-fé das pessoas, tenho para mim que a Estátua de Eça de Queirós “esteja apenas guardada para restauro” (por cerca de cinquenta anos?) no “porão” de um museu local, portanto, não vejo grande dificuldade para a vereação da Cultura resolver o caso, pois deve ter em arquivo (muitíssimo bem guardados) os documentos que conferem autenticidade à obra e que registam o seu percurso em solo caldense.
José Maria Eça de Queirós nasceu na Póvoa de Varzim, no dia 25 de novembro de 1845 e faleceu em Neuilly-sur-Seine, na Île-de-France, a 16 de agosto de 1900. Considerado um dos melhores escritores da Língua Portuguesa, sendo autor de livros de inegável valor, traduzidos para diversos idiomas, está atualmente renegado a um patamar meramente contemplativo. Mais uma vítima do autofagismo que acomete a Cultura portuguesa há décadas.
Ferdinand-Victor Eugène Delacroix (1798-1863) diz-nos que “O mais belo triunfo do escritor é fazer pensar os que podem pensar”, e Eça de Queirós, através de páginas irrepreensíveis, é um desses autores, merecendo, portanto, todas as consagrações (menos ter os seus restos mortais transladados para o Panteão Nacional, por gesto politiqueiro e contra a vontade da família).
A população (e a classe política) das Caldas da Rainha, se oferecesse alguma atenção ao seu património (histórico, museológico, etc.), teria dado conta do desaparecimento de tão relevante obra de arte.
A cautela na preservação de todas as formas artísticas de um concelho, confere ao próprio uma relevância ímpar, legitimando, assim, a memória das sociedades.
A estátua de Eça de Queirós não é apenas uma alusão a um escritor do passado, é sim, a grande referência de um património que se quer enaltecido, de uma memória que se deseja eterna, de uma história que se pretende atual, de uma construção de saberes que enriqueçam mentalidades. E é, por fim, uma vénia, um agradecimento, um sinal de respeito, a um autor do mundo, que, por acaso, falava português, este idioma tão maltratado por todos os falantes deste retângulo “à beira mar plantado”.
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