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Pena para mãe que tentou matar o filho passou de dez para treze anos de prisão

Francisco Gomes

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Residente no concelho de Óbidos, onde foi bombeira, Patrícia Ribeiro, de 29 anos, foi condenada pelo Juízo Central Criminal de Lisboa a dezassete anos de prisão por sete tentativas de homicídio do filho, quando este tinha seis e sete anos. O recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa baixou a pena para dez anos. Inconformado, o pai da criança também recorreu e o Supremo Tribunal de Justiça decidiu aplicar treze anos de cadeia.
A arguida referiu que gostaria de refazer a sua vida e que o filho a perdoasse

Primeiro, por acórdão de 20 de julho de 2020, o Juízo Central Criminal de Lisboa condenou a arguida pela prática do crime de homicídio, na forma tentada, por sete vezes. Em cúmulo jurídico, a pena de prisão foi fixada em dezassete anos.

Foi ainda condenada, quanto aos pedidos de indemnização civil apresentados, a pagar ao filho, representado pelo pai, a quantia de trezentos mil euros, a título de danos não patrimoniais, a pagar ao pai da criança vinte e cinco mil euros, a título de danos não patrimoniais, e a pagar a dois hospitais (Centro Hospitalar do Oeste e Hospital D. Estefânia) mais de vinte e dois mil e quinhentos euros, acrescidos de juros.

O mesmo tribunal tinha decidido não impedir o contacto com o filho.

A arguida interpôs recurso para o Tribunal da Relação, que, por acórdão de 2 de dezembro do ano passado, baixou a pena para dez anos de prisão e absolveu-a do pedido de indemnização formulado pelo pai da criança, reduzindo ainda a indemnização à criança para cem mil euros.

Inconformado com tal decisão, o pai da criança contestou e o caso foi para o Supremo Tribunal de Justiça, que a 6 de maio deste ano aplicou à arguida a pena de treze anos de prisão, mantendo-se, quanto aos pedidos de indemnização civil a decisão da primeira instância: trezentos mil euros ao filho e vinte e cinco mil euros ao pai, a título de danos não patrimoniais.

É a pena “adequada, necessária e proporcional de acordo com uma análise global dos factos e da personalidade da arguida neles refletida”, refere o Supremo Tribunal de Justiça, que esclarece que a arguida “em parte alguma apresenta pedido para que o valor das indemnizações seja alterado, não havendo, pois, qualquer impugnação destes montantes”, mantendo-se assim, os valores da primeira decisão.

Empurrão para tanque cheio de água

O filho da arguida, nascido em maio de 2012, deu entrada, várias vezes, na urgência pediátrica de hospitais entre 17 de abril e 25 de junho de 2019.

O primeiro episódio aconteceu quando ainda tinha seis anos, nas instalações de um centro de mergulho em Peniche, onde Patrícia Ribeiro trabalhava.

“Quando se encontrava sozinha com o filho, num momento em que este estava sentado num sofá e distraído com o telemóvel, a arguida, puxando-o pelos pés, arrastou-o pelo chão para o tanque de treino de mergulho com três metros de profundidade ali existente cheio de água e empurrou-o para dentro”, descreve o tribunal.

O rapaz “caiu dentro do tanque com água completamente vestido, ali permanecendo por tempo indeterminado, e só quando se encontrava inconsciente foi retirado da água pela arguida”, adianta.

A criança “vomitou e entrou em paragem cardiorrespiratória, tendo então a arguida procedido a manobras de reanimação e suporte básico de vida, tendo conseguido a sua reversão, após o que substituiu ao menor a roupa exterior molhada por outra seca e chamou o INEM para o local, alegando que o menor estava com alterações do estado da consciência, tinha vomitado e apresentava dificuldades respiratórias”.

Foi levado para a unidade das Caldas da Rainha do Centro Hospitalar do Oeste, apresentando “um quadro grave, decorrente de paragem cardiorrespiratória” e apenas teve alta clínica ao sétimo dia de internamento.

Quando chegou ao hospital a criança conseguiu dizer ao pai que a mãe “o tinha empurrado para a piscina com água, informação relatada à equipa médica, que a desvalorizou por poder ser atribuída a uma reação de confusão”.

Comprou substância tóxica e deu ao filho

No dia 2 de maio de 2019, a arguida, após ter efetuado uma pesquisa na internet, adquiriu uma embalagem de um litro de clorofórmio, com a intenção de administrar aquele produto tóxico ao filho.

“Sabia que a ingestão, inalação ou contacto dérmico de tal substância tóxica, dependendo da dose, pode causar a morte e provocar lesões graves na saúde, nomeadamente, alteração nos ritmos respiratórios e cardíaco, paragens cardiorrespiratórias, hipotensão, náusea, vómito, lesões hepáticas e renais, entre outras”, relata o tribunal.

Pagou trinta e três euros e oitenta e três cêntimos e apresentou o número de identificação fiscal, morada e conta de correio eletrónico de uma aluna do curso de mergulho ministrado pela empresa onde trabalhava.

Na madrugada de 12 de junho, tendo o filho ao seu cuidado na sua residência, quando já se encontrava deitado, “tapou-lhe a cabeça com o lençol, segurando-o com as mãos por detrás da cabeça, fazendo-o com força por tempo indeterminado”.

“O menor vomitou e teve perda de conhecimento, com paragem cardiorrespiratória. A arguida administrou-lhe então a adrenalina que tinha na sua posse e que lhe tinha sido receitada no hospital para situações de emergência, para reverter os efeitos da paragem cardiorrespiratória provocada por ela e para fazer crer que o filho tinha sido acometido de novo episódio, de causas inexplicadas, semelhante ao ocorrido em 17 de abril”, deu como provado o tribunal.

De novo transportado para o hospital, a equipa médica não conseguiu diagnosticar a causa da paragem cardiorrespiratória verificada.

No dia 13 de junho foi transferido para o Hospital D. Estefânia, em Lisboa, para internamento e estudo. Face às melhorias registadas no seu estado de saúde a equipa médica informou a arguida e esta conseguiu administrar clorofórmio ao filho, usando uma seringa que acoplou ao cateter, indo depois dar o alerta que o seu filho estava com dificuldades respiratórias.

Os médicos realizaram manobras de reanimação com administração de adrenalina, revertendo a situação. Esteve em coma induzido, mas acabou por ter melhoras progressivas nos dias seguintes.

Porém, no dia 16 de junho, novamente a arguida repetiu a administração de clorofórmio e o estado de saúde da criança voltou a agravar-se.

E dois dias depois, mais uma vez a mãe efetuou nova administração de clorofórmio ao filho. Contudo, foi detetado que o prolongamento de cateter de acesso intravenoso colocado no braço direito “apresentava uma coloração diferente do habitual (mais baça), e um cheiro a cola”, o que sustentou as suspeitas junto dos médicos que o agravamento do estado de saúde da criança “teria de ser motivado por qualquer intervenção de terceiros, através da administração de qualquer substância tóxica que causava os sucessivos agravamentos do estado de saúde”.

“Soro abençoado” foi argumento quando foi apanhada

A criança foi transferida para mais próximo do local de permanência do pessoal clínico e sujeita a maior vigilância, e a Polícia Judiciária, através da “Secção de Homicídios”, foi alertada para estas ocorrências e iniciou a investigação.

No dia 21 de junho, aproveitando a pausa para jantar do pessoal de enfermagem, quando a vigilância era menor, a arguida efetuou novamente a administração de clorofórmio ao filho, desta vez por via oral, provocando novo episódio de paragem cardiorrespiratória, que durou três minutos, com novo surgimento de sangue no vómito, na urina e também nas fezes.

No dia 25 aconteceu o último episódio de administração de clorofórmio, através de uma seringa, que acoplou ao cateter colocado no pé esquerdo do filho.

A arguida atirou a seringa para o caixote do lixo do quarto e quando foi confrontada pelos elementos clínicos disse que tinha ministrado ao filho “soro abençoado”.

Viria a ser recolhido na sala dos pais, no interior do cacifo que estava afeto à arguida e onde a mesma guardava os respetivos pertences, um frasco de vidro que estava dentro de um saco térmico, contendo um líquido incolor que submetido a exame no Laboratório de Polícia Científica foi identificado como clorofórmio.

O menor esteve internado 44 dias e teve alta hospitalar no dia 14 de agosto, com indicação de continuar os tratamentos, admitindo-se a possibilidade de complicações futuras.

Objetivo era atrair a atenção para o seu papel de mãe

A arguida foi sujeita a exame pericial psiquiátrico que revelou um quadro psicopatológico enquadrável numa perturbação designada síndrome de Munchausen por Procuração. Basicamente, “queria atrair sobre si a atenção das pessoas que lhe estavam mais próximas, pois cada vez que o filho era acometido de um agravamento súbito do estado clínico se sentia valorizada como mãe”.

Apesar disso, “não demonstrava muita preocupação com o estado de saúde do filho e sobretudo com a origem dos problemas sucessivos”.

O tribunal considerou que Patrícia Ribeiro conhecia os efeitos do clorofórmio e que “dependendo da dose, pode causar a morte, alteração nos ritmos respiratórios e cardíaco, hipotensão, náusea, vómito, lesões hepáticas e renais, entre outras”.

Causou graves problemas de saúde ao seu filho, cardiorrespiratórios, com colapso quase total do pulmão esquerdo e hemorragias, que, para além de “doloroso sofrimento”, se não tivessem sido revertidas a tempo “teriam originado a morte da criança”.

A mãe quis praticar estes atos “sabendo que poderia resultar a morte do filho e mesmo assim não se absteve de os prosseguir”.

O menino era “saudável, com toda uma vida pela frente, mas em consequência dos atos violentos a que foi sujeito não é possível prever as consequências ou sequelas que daí poderão advir”, reconhece o tribunal.

Tentou suicidar-se

O tribunal analisou o passado de Patrícia Ribeiro e apurou que por volta dos dez anos engoliu um cocktail para controlar pragas de roedores, tendo vomitado de seguida. Cerca dos quinze anos tentou atirar-se de um ponto alto, sendo agarrada pela progenitora. Menos de um ano depois foi localizada num apartamento de que a mãe é proprietária, com uma carta escrita e com a intenção de se suicidar, planeando atirar-se do sétimo andar.

É neste contexto que começa a ser acompanhada por serviços de psicologia e orientação, mas até se enquadrou na sociedade, tendo sido catequista e voluntária no Centro Hospitalar do Oeste e, posteriormente, nos bombeiros de Óbidos. Frequentou o ensino superior, que não concluiu, com o nascimento do filho.

Iniciou um relacionamento afetivo com o pai do seu filho, dez anos mais velho, com quem foi viver pouco tempo depois, mas em 2016 separam-se.

A criança passa a viver uma semana em casa de cada progenitor, situação que se manteve aquando da regulação do poder paternal após o divórcio em 2017.

É neste período também que Patrícia Ribeiro reencontra um colega de liceu e inicia relacionamento com o mesmo, até que em abril de 2019 ele decide terminar a relação contra a vontade da arguida. Foi então que ela engendrou o plano para chamar a atenção.

Presa desde 26 de junho de 2019, após um período de internamento no serviço de psiquiatria do hospital prisional de Caxias, por tentativa de suicídio ocorrida no segundo dia de reclusão, tem vindo a ser acompanhada e considera que o apoio psicológico tem sido essencial para o seu equilíbrio psicoemocional.

Segundo o tribunal, a arguida “refere que gostaria de refazer a sua vida e que o filho a perdoasse, não deixando, no entanto, de se apresentar conformada à situação em que se encontra”.

Pai da criança em sofrimento

O pai da criança “passou por um enorme sofrimento psicológico, porquanto viu o seu filho padecer em consequência de uma doença que as equipas médicas não conseguiam descobrir as causas, chegando mesmo a pensar que podia morrer, o que lhe causou depressão, tristeza e desespero”, sublinhou o tribunal.

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