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Estado obrigado a pagar 200 mil euros a família de bombeira que morreu intoxicada em 2006

Francisco Gomes

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Já se passaram 14 anos e meio desde que Viviana Dionísio, contratada pelos Bombeiros Voluntários das Caldas da Rainha mas a prestar serviço como operadora de comunicações do Centro Distrital de Operações de Socorro de Leiria, foi mobilizada para um grande incêndio na Serra de Aire e Candeeiros e morreu intoxicada. A família da vítima nunca recebeu uma indemnização do Estado, porque o processo nos tribunais tem-se arrastado ao longo dos tempos, mas agora houve uma decisão judicial que obriga ao pagamento de 200 mil euros.
Viviana tinha 29 anos

A bombeira, natural do Bombarral, morreu intoxicada aos 29 anos num incêndio na Serra de Aire e Candeeiros, na madrugada de 11 de agosto de 2006, devido ao indevido funcionamento de um gerador, que originou a acumulação de monóxido de carbono no interior do veículo de comunicações em que estava a trabalhar.

A família vai receber uma indemnização de 200 mil euros, depois de ter sido chumbado o recurso do Ministério Público (MP), que para além de não aceitar a culpa do Estado, pretendia reduzir em 90 mil euros o valor a pagar.

Segundo o acórdão de 4 de fevereiro do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), a solução defendida pelo MP de que se tivessem em conta os valores praticados no ano em que a morte ocorreu e não em 2017, quando a decisão alvo de recurso foi tomada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (TAFL), não é aceitável, uma vez que o tempo que se arrastou o processo “nunca será devidamente compensado pelos juros devidos”.

O MP também pretendia que a responsabilidade da morte fosse atribuída à empresa contratada pelo então Serviço Nacional de Bombeiros e Proteção Civil (SNBPC) para fornecer o gerador e à empresa subcontratada que aplicou o mesmo na viatura, alegando haver um defeito no produto (falta de tamponamento) e na sua integração no veículo (sítio onde foi colocado), que originou valores de concentração de monóxido de carbono demasiado elevados na cabine do veículo onde a bombeira se encontrava e que determinaram a sua morte.

Para o TAFL, “o SNBPC determinou a transformação da viatura, nela colocando um gerador de corrente elétrica, e nada mais previu o Estado como forma de minimizar os riscos das emissões de monóxido de carbono a ele inerentes”.

“O gerador viria a ser encastrado no lado direito da carroçaria da viatura, com um escape localizado na parte inferior do veículo, com um suporte no chassis, cuja saída estava orientada para a parte da frente do veículo, perto de um buraco no mesmo chassis com 0,12m de diâmetro, sem tamponamento com recurso a uma tampa de plástico rígida, que é de origem. Certo é também que aquele gerador esteve a funcionar na noite de 10 de agosto de 2006 e na madrugada do dia seguinte, altura em que o motor do veículo esteve desligado”, refere a sentença do TAFL.

O tribunal destacou que “precisamente em função da localização e caraterísticas do escape do gerador, o fumo daquele escape entrou no chassis do veículo pelo orifício junto à pala da roda traseira do lado direito, espalhando-se por essa estrutura e contaminando lentamente o ambiente com monóxido de carbono, que é um gás muito tóxico, mas inodoro, incolor e insípido, que se mistura facilmente com o ar, sem que as pessoas dele se apercebam”.

Por outro lado, um relatório da Autoridade para as Condições do Trabalho registou que o SNBPC não possuía o respetivo documento de compra, nem a declaração de conformidade europeia, nem manual das caraterísticas técnicas, nem manual de instruções. Mais: Nem sequer se certificou se terão sido introduzidas mais modificações na viatura após o despacho de homologação da ex-Direção Geral de Viação.

Para os juízes desembargadores do tribunal de apelação que apreciaram o recurso do MP, “nada abala a fundamentação do TAFL”, que determinou que cabia ao SNBPC “o dever de implementar um processo de análise dos riscos profissionais para, desse modo, se assegurar que a prestação de trabalho era efetuado em condições de segurança, mas nada disso foi feito”.

Segundo o tribunal, o gerador de corrente elétrica contaminou de monóxido de carbono o interior da viatura, que tinha sido dividida em três compartimentos: A traseira servia para o planeamento, a parte do meio para o comando e a frente era a cabine de condução. O gerador tinha uma saída orientada para a frente da carrinha. Após horas de trabalho a bombeira foi descansar um pouco e cerca das quatro da manhã deitou-se no banco da frente do veículo de comando operacional e comunicações. Inalou o gás tóxico e isso foi-lhe fatal. Morreu intoxicada.

Foi encontrada por volta das sete horas em paragem cardiorrespiratória por um colega, na altura em que foi chamá-la para colocar combustível no gerador da viatura. Ricardo Soares era o outro operador de comunicações que estava no terreno e que também tinha descansado momentos antes, mas com o vidro do carro ligeiramente aberto, o que permitiu o arejamento e pode ter levado a que não fosse vítima do gás tóxico que entrou na cabina.

Retirou-a do veículo e pediu ajuda, ao mesmo tempo que iniciou as manobras de reanimação. Foi transportada de seguida para o Hospital de Leiria, onde foi confirmado o óbito.

Danos pelo desgosto da perda

Os juízes desembargadores concordaram que a família da bombeira sofreu um “grande desgosto” com a sua morte, como ficou explícito na sentença do TAFL: “Causou aos seus pais um profundo abalo, fortíssima comoção e um desgosto inultrapassável. O pai faleceu durante a pendência da ação judicial e a mãe encontra-se afetada física, psicológica e psiquicamente, deslocando-se quase diariamente ao cemitério onde Viviana se encontra sepultada, e apesar de decorridos anos desde os factos, revive permanentemente o fatídico dia”.

Tratou-se, para o TAFL, da morte de “uma pessoa jovem, dotada de vitalidade assinalável, com uma esperança de vida ainda longa à sua frente, e que de forma inesperada ficou privada da sua vida”.

O TCAS atribuiu à família de Viviana uma indemnização global de 200 mil euros pela morte e danos não patrimoniais decorrentes do desgosto da perda do ente querido, a que acrescem juros moratórios, à taxa legal, desde a data da citação e até efetivo pagamento.

O montante inicialmente pedido tinha sido 500 mil euros (300 mil de indemnização pela morte e 100 mil para o pai e 100 mil para a mãe por danos não patrimoniais), mas os juízes desembargadores não alteraram a decisão tomada em primeira instância pelo TAFL, que havia manifestado que “tal valor não se mostra adequado porque excede largamente os montantes que a jurisprudência tem julgado proporcionais em situações idênticas”.

O MP também tinha argumentado que a redução da indemnização de 200 mil para 110 mil euros era mais justa perante um valor “excessivo”, invocando ter de haver em “especial consideração a situação de crise económica vivida pelo nosso país, a necessidade de continuação da contenção das finanças públicas e o nível de vida que é bastante mais baixo do que noutros países”.

A acusação insurgiu-se contra o pedido de redução da quantia indemnizatória fixada, afirmando que “regatear o valor modesto da indemnização” trata-se de “um gesto insultuoso”, para apontar ainda que “em momento algum” foi formulado “um pedido de desculpas formal do Estado” à família da vítima pela morte.

O arrastar do processo foi igualmente criticado pela acusação, que interrogou: “O Estado testa a resistência dos demandantes, fazendo-os esperar. Espera que vão falecendo um a um, como já sucedeu? Espera que desesperem ao ponto de desistir? Não fossem os tribunais…”.

O valor da indemnização fixado (à mãe 100 mil euros pela morte, mais 50 mil por danos não patrimoniais decorrentes do desgosto, e 25 mil euros a cada um dos dois irmãos, na qualidade de herdeiros do pai, pelos danos não patrimoniais) teve em consideração o “grau de proximidade” da vítima com a família, o “preço da angústia”, assim como o montante que tem vindo a ser decidido noutros casos pelo dano de morte, que “em média se situa entre os 50 e 80 mil euros, e que raramente excede os 100 mil”.

O TCAS corroborou o entendimento do TAFL de que a verba não vai compensar a perda da vida, mas deverá ser “significativa e não meramente simbólica”.

Não foi julgada a responsabilidade criminal, apenas a cível.

A justiça poderá ainda não ser aplicada, caso haja novo recurso, desta vez para o Supremo Tribunal Administrativo. Numa primeira instância o MP do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria arquivou o processo e perante a contestação da família da vítima recusou a reabertura, tendo o caso sido julgado no TAFL, cuja sentença foi recorrida pelo MP e apreciada agora pelo TCAS.

Aldeias cercadas pelo fogo

O fogo desceu a serra e no sopé existiam muitas casas no meio de pinhais que tiveram de ser defendidas. A força do vento espalhou as chamas e o IC2 teve de ser cortado ao trânsito. Aldeias estiveram cercadas e habitações ameaçadas, e pese embora não tenha havido registo de casas ardidas, foi contabilizada a destruição de muitos barracões agrícolas e máquinas de uma pedreira. Muitos animais, como porcos, leitões, patos e perus, morreram carbonizados.

O incêndio mobilizou 347 operacionais e 89 veículos, incluindo três aeronaves, tendo destruído uma vasta área do concelho de Porto de Mós na Serra de Aire e Candeeiros.

Um bombeiro sofreu queimaduras num braço e outro ficou com alergia devido às altas temperaturas.

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