O WPC realiza-se nas Caldas da Rainha desde 2017, ano em que a iniciativa foi relançada, depois de não ter lugar em 2016 por falta de patrocínios. Nesta edição do certame, que fica marcada pela “pandemia e ausência de alguns premiados”, concorreram mais de mais de mil obras publicadas em 2019, e destas foram seleccionadas 280 caricaturas, cartoons editoriais e desenhos de humor, que foram divulgados em 150 publicações de mais centena de países.
A seleção foi feita por um júri internacional, que integrou para além do diretor do salão, António Antunes, os cartoonistas Jacuk Wiejacki (Polónia), Osmani Simanca (Cuba), Jean-Michel Renault (França) e a jornalista Sabine Glaubitz (Alemanha).
Entre as caricaturas, destacam-se as da jovem ativista Greta Thunberg, do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, do presidente norte-americano, Donald Trump, e do primeiro-ministro britânico Boris Johnson, que valeu a subida ao palco duas vezes do cartoonista alemão Frank Hoppman. Primeiro para receber o prémio na categoria Caricatura, no qual obteve o primeiro lugar, e depois para receber o grande prémio da 15.ª edição do WPC.
“Donald Trump ou Boris Johnson são verdadeiros personagens de cartoon e se os quiser desenhar de forma crítica ou satírica tenho de acrescentar algo pessoal ao desenho, e isso nem sempre é fácil”, explicou o desenhador alemão, adiantando que “os prémios são muito importantes, sobretudo numa arte como o cartoon, que é muitas vezes sobrevalorizada”.
Na mesma categoria Caricatura, o júri atribuiu o 2.º prémio à obra “Jair Bolsonaro”, do mexicano Darío, publicado no jornal espanhol Mundiario. A encerrar o pódio, destaque para o português Pedro Silva, que criou “Christine Lagarde”, trabalho publicado na plataforma holandesa Cartoon Movement.
Para o cartoonista português é “muito importante este prémio”. “Sempre gostei de caricatura, desde miúdo, embora não seja um profissional de publicar na imprensa, mas este ano tive oportunidade de publicar online”, contou.
O desfile de prémios, em que “o poder do cartoon é de desconstruir tabus”, continuou com a categoria Cartoon Editorial. Foram distinguidos com o 1º prémio o grego Aytos, autor do desenho “Política Mundial”, publicado na plataforma de cartoons holandesa Cartoon Movement, e o brasileiro Cau Gomez, com o desenho “Tatuagem Xi Jimping”, publicado no jornal brasileiro “A Tarde”, com o 2º prémio.
Presente no evento, o cartoonista brasileiro referiu que “o momento que vivemos atualmente no Brasil é realmente sério, e não desejo isso aqui para Portugal. Hoje temos um vírus muito mais letal do que a Covid-19, o vírus da ignorância, intolerância e opressão, através de um representante que prega por um mundo mais ordinário, por isso, acho que os cartoonistas devem continuar o seu trabalho”, sublinhou Cau Gomez.
O terceiro lugar foi atribuído ao artista grego Kountouris, por “Coletes de Salvamento e Coletes Amarelos”, publicado nas páginas do jornal grego “Efimerida Ton Syntakton”.
Já na categoria de desenho de humor, um desenho que não diz diretamente respeito a um momento concreto, o primeiro prémio foi atribuído ao grego Georgopalis, com “Message in a Bottle”, seguido do nicaraguense Px Molina, com “Populismo”, e do croata Listes, com “Novos Líderes Mundiais”. Os trabalhos foram realizados para as publicações Real News, Confidencial e Buduàr, respetivamente.
Estes e outros publicados em 72 países encontram-se expostos no Centro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha até ao dia 15 de novembro.
“Jornais sem cartoons, são jornais incompletos”
A cerimónia, cuja apresentação esteve a cargo novamente de Inês Gonçalves, do programa “5 Para a Meia-Noite”, da RTP1, também ficou marcada pelo discurso inicial. “Neste milénio que começou tão mal, com ataques terroristas, crises financeiras globais e desastradas respostas políticas aos múltiplos desafios, sociais, económicos e ambientais que a humanidade enfrenta, há também ameaças à democracia. A verdade e o rigor estão cada vez mais ausentes da narração jornalística, mitos e realidades confundem-se, o jornalismo sério viu-se obrigado ao permanente exercício “fact checking” com uma mão cheia de repórteres remetidos ao triste destino de inspetores da verdade, policiando minuciosamente as declarações dos políticos. A guerra entre o dito e o feito incentivou a produção jornalística a uma vítima colateral, e essa vítima chama-se cartoon, porque o desenho de humor não é um detetor de mentiras, nem o ateliê do cartoonista é um laboratório onde se processa essa análise para separar o que é verdade do que é falso”, manifestou.
Igualmente referiu que os “editores de jornais muito sérios e prestigiados assediados pela turba, não hesitaram fazer aos seus desenhos o que nunca poderiam aceitar o que alguém poderia fazer aos seus textos, censura pura e dura, em certos casos chega a ser total, jornais sem cartoons, são jornais incompletos”.
“Editores que despedem cartoonistas pela violência crítica das suas sátiras são jornalistas indignos e o objetivo mais vasto dessa repressão inorgânica, e no entanto bastante feroz, é empurrar os cartoonistas para a auto censura”, sublinhou a organização do evento, apelando a que “os jornais continuem a convidar cartoons e que os cartoonistas possam continuar e exprimir-se sem qualquer amarra”.
Já o cartoonista António, diretor do WPC, referiu que “2019 foi um período difícil mas nós resistimos, e por isso acho que quem gosta de liberdade de expressão gosta de cartoon”. Portanto, “aqui a Câmara Municipal das Caldas deu um bom exemplo disso até porque a caricatura faz parte do ADN da cidade, e este evento não pode parar”.
Questionado sobre a falta de “mais mulheres no cartoon”, o organizador disse que “há cada vez menos cartoonistas em geral, tanto mulheres como homens. Isto é pouco atrativo, as pessoas que têm opção escolhem outros caminhos mais promissores”.
Presente também esteve o presidente da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, Tinta Ferreira, que falou da mais-valia que o WPC traz à cidade. “A edição de 2020 vem confirmar as Caldas da Rainha como o concelho do humor e da caricatura em Portugal, e permite dar a conhecer a cidade ao mundo. Tendo presente as anteriores edições estamos certos que a exposição de 2020 será um êxito a nível nacional e internacional”.
Entre as entregas dos prémios e os discursos dos premiados, a noite também foi abrilhantada pelas atuações do humorista belga Elliot Jenicot e do duo humorista italiano, Luca & Tino. A animação musical esteve a cargo da orquestra ligeira Monte Olivett, constituída por músicos da cidade e dirigida pelo maestro David Santos.
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