Esta pandemia corresponde a uma situação nova para todos os profissionais de saúde, uma situação que nos levou a reinventarmo-nos, que obrigou a que todas as instituições de saúde e os seus profissionais de saúde se reorganizassem e adaptassem a uma nova realidade, que impôs novas regras e novas rotinas.
Para as pessoas externas ao ambiente hospitalar, as alterações a nível do espaço físico são as mais evidentes, contudo, considero que a maior transformação e o maior desafio imposto se prende na capacidade que os profissionais de saúde tiveram para se ajustar a uma nova realidade, uma nova doença e a todas as consequentes alterações exigidas pela mesma.
Curiosamente, 2020 é um ano com um enorme significado simbólico para nós, enfermeiros, pois comemoram-se os 200 anos do nascimento de Florence Nightingale, pioneira da enfermagem e do cuidar. A OMS estipulou que este fosse o Ano Internacional do Enfermeiro, o ano da luta pela valorização da profissão.
No entanto, este está a revelar-se um ano de grandes desafios numa perspetiva diferente. Vivemos momentos de prova de união, de coesão e de partilha. Os tempos atuais vieram reforçar o quão fundamental é o trabalho de equipa em Enfermagem e o espírito de entreajuda, para que consigamos chegar a bom porto e ganhar esta luta, contra aquele que é um inimigo desconhecido. Um inimigo que nos surpreende dia após dia, que nos obriga a um processo de aprendizagem contínuo, por forma a dar sempre a resposta mais adequada a cada situação.
A crise pandémica a que estamos sujeitos neste momento tem influência tanto a nível pessoal/social como a nível profissional. Muitas pessoas acabam por perguntar, se temos medo, e a verdade é que sim, temos medo. Temos medo de ser infetados, temos medo de ser um vetor de transmissão, temos medo de colocar em risco os nossos entes queridos. Temos medo de não conseguir fazer mais pelas pessoas que temos à nossa frente. Sim, o medo passou a ser um sentimento constante nas nossas vidas, mas assim como este, também a esperança, a dedicação eo espírito de equipa se tornaram mais evidentes que nunca. Aprendemos que não somos nada uns sem os outros, e que para conseguirmos o grande objetivo, que é a irradicação desta doença, precisamos de todos, de todos os profissionais de saúde, mas principalmente, de toda a restante população. Precisamos que nos ajudem a ajudar, que seja travado este ciclo transmissor, que sejam cumpridas todas as regras. Porque, sem a dedicação e esforço de todos esta missão torna-se cada dia mais difícil e dura.
O número de profissionais de saúde infetados em Portugal ultrapassa, atualmente, os 3600 casos. No serviço em que estou a exercer funções já tivemos três casos de colegas infetados com esta doença. Consigo relembrar o dia em que fomos informados que “um dos nossos” estava também na luta contra esta doença. Lembro-me de me sentir impotente, lembro-me de sentir medo e de, nesse momento, ter plena consciência que ninguém esta imune, que mesmo com todos os cuidados e todas as recomendações cumpridas o vírus é uma realidade patente. Felizmente, todos os nossos colegas foram casos de sucesso, de superação e rapidamente voltaram a estar na linha da frente desta luta.
Mas os verdadeiros heróis desta luta difícil não somos nós, são os doentes internados, sem visitas, muitos deles privados de verem os seus familiares durante muitas semanas ou mesmo meses. Esta é uma situação de grande provação para todos. Mas é por eles e para eles que trabalhamos todos os dias na esperança de um dia vencermos não a batalha, mas a guerra. Para isso contamos com todos e com cada um, pois só juntos teremos capacidade para vencer este inimigo.
Ana Rita Coito
Militante JSD Caldas da Rainha/ Enfermeira do SUMC do CHO de Caldas da Rainha
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