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Testemunhos de profissionais de saúde das Caldas que sobreviveram à Covid-19

Marlene Sousa

EXCLUSIVO

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O JORNAL DAS CALDAS falou com três profissionais de saúde nas Caldas da Rainha que fazem parte do grupo de milhares de pacientes que já se curaram depois de terem sido infetados pela Covid-19. Quiseram dar o seu testemunho para alertar a população para “a preservação das medidas de segurança que aprendemos, com o retomar à normalidade possível”.
A enfermeira Sara Pires

Enfermeira Sara Pires, de 36 anos

A enfermeira Sara Pires, de 36 anos, que trabalha no Centro Hospitalar do Oeste (CHO), unidade das Caldas, desde 2006, e desde 2014 no Serviço de Urgência, foi a primeira profissional de saúde a ficar infetada no hospital.

Esteve internada seis dias no Hospital Santo André, em Leiria, no serviço de internamento de Cuidados Agudos Polivalente (UCAP) – transformado provisoriamente em Serviço Covid, onde só estavam pessoas infetadas.

Sara Pires teve breves momentos em que sentiu “medo de morrer”. “É até estranho recordar essa sensação agora que já passaram mais de dois meses e na verdade acabei por melhorar rápido, após esses maus sentimentos”, confidenciou. A sua família ficou assustada, “mas no fundo todos sabiam que eu ia ficar bem”, salientou.

A enfermeira soube que estava infetada com Covid-19 no dia 29 de março. “Na véspera, acordei a sentir-me estranha, com o corpo quebrado. No dia anterior tinha iniciado rinorreia (congestão nasal, que não é um dos sintomas típicos da infeção por Covid) e não valorizei. Nesse sábado fazia a tarde, mas ao chegar ao serviço iniciei febre e já não trabalhei. Por indicação da minha chefia, fiz o teste e voltei para casa”, contou.

Sara Pires recorda o dia seguinte “terrível e marcante”. “O meu chefe ligou-me pelas 11h00 para me dizer que não tinha boas notícias, o teste era positivo. Já pressentia esta notícia, porque desde essa madrugada senti-me muito mal, com picos febris muito difíceis de suportar”, relatou.

Foi aí que se sentiu verdadeiramente perdida, pois não sabia o que fazer. “Sair de casa para me isolar? Isolar-me em casa? Seria melhor sair o meu filho e o meu marido?”, foram algumas das dúvidas que lhe surgiram.

“Era tudo muito inicial ainda…a informação, o conhecimento, as medidas, as normas…não sabia o que fazer, e ninguém tinha informações consistentes para me ajudar. E, sobretudo, senti medo de ter contagiado alguém próximo de mim”, lembrou.

Os sintomas iniciais foram rinorreia e febre. “Depois iniciei um quadro de dor de cabeça intensa, cansaço respiratório, tosse (inicialmente seca) e mantive sempre picos de febre. Tinha também dores musculares, falta de apetite, não tinha cheiro nem sabor. Ao quarto dia melhorei e ao quinto voltei a piorar. Ao sexto dia comecei a sentir-me a cada hora pior, com febre menos espaçada, dor torácica e um cansaço muito fácil a pequenos esforços, e liguei para o 112 para ir para o hospital”, indicou Sara Pires.

Em casa tomou “antipiréticos e analgésicos”. No hospital foi medicada com a hidroxicloroquina e azitromicina depois de lhe diagnosticarem pneumonia por Covid-19.

Fez muita medicação analgésica quando estava internada, sobretudo porque as “dores de cabeça foram o último sintoma a melhorar”. “Um dos dias experimentei inclusive a morfina e a dor teimou em não passar ainda por umas horas. Mas depois superou”, relatou.

Sara Pires tem um filho com três anos e um enteado com onze e a separação da família foi “emocionalmente difícil”.

O seu enteado já estava com a mãe há duas semanas quando a enfermeira adoeceu, decisão que tinha tomado com o seu marido dado o “risco de contágio acrescido que tinha, para não aumentarmos a possível cadeia de transmissão”.

O isolamento do seu filho, dentro da sua casa, foi para Sara Pires “difícil”, porque não é “fácil transmitir a uma criança com três anos que não pode estar com a mãe, ir ao colo, dar um abraço ou um beijinho”. “Felizmente ele não adoeceu, como a grande parte das crianças não vai adoecer”, referiu.

Segundo a profissional de saúde ninguém da sua família ficou infetado. “Mantive isolamento total dentro de casa, num quarto com casa de banho privativa, o meu marido entrava com o equipamento de proteção individual para deixar as refeições”. Manteve-se isolada de qualquer saída ou contato durante as três semanas que esteve infetada. “As compras eram entregues na varanda pela minha irmã e cunhado, algumas refeições prontas, outros bens e alguns mimos por alguns amigos e também os vizinhos”, lembrou.

As suas âncoras foram em primeiro lugar o seu marido e em segundo “uma “rede” de família e amigos que me mostraram mais uma vez, como sou uma pessoa cheia de sorte, por ter tanta gente que me quer bem, que nos quer bem, e que fez tudo para nos ajudar, com a parte prática da questão, mas também com a parte emocional”.

A enfermeira regressou ao trabalho no início de maio, “ansiosa, com algum medo, mas com vontade de regressar”. “Voltar a trabalhar, significava virar a página. E assim foi. Na urgência não há muito tempo para sentir ansiedades. O fluxo de trabalho faz-nos dissipar medos e ansiedades com a mesma velocidade, que os instala”, contou.

Apesar de ainda não haver provas concretas, Sara Pires acredita que está “imune” e que não vai voltar a adoecer. “Como costumo brincar. Um cavalo não galopa duas vezes sobre a mesma cabeça”, gracejou.

A enfermeira apela a que temos de manter “respeito por esta doença e consciência cívica, pessoal e social”.

Por um lado, “devemos seguir normas de higienização e utilizar os espaços públicos de uma forma ainda diferente do nosso habitual”.

De acordo com a profissional de saúde, nesta fase de desconfinamento cada um deve estar “mais atento e se tiver sinais e sintomas de infeção, fazer o seu isolamento profilático e vigiar sintomas dos seus contatos próximos”.

A consciência pessoal e social é, para Sara, o que “poderá fazer diferença”. “A vida tem de voltar a ser o que era, com passos mais curtos e mais cautelosos”, sublinhou. Hoje, dois meses e dez dias depois de estar infetada, continua a conseguir dizer “existe vida para além da Covid. A minha é uma delas”, assumiu.

Enfermeiro Hugo Santos, de 27 anos

Eis o relato de quem, aos 27 anos, esteve duas semanas em isolamento num quarto nas Caldas com Covid-19. Hugo Santos, enfermeiro no serviço de urgência do hospital das Caldas, apanhou um grande susto, mas curou-se e já regressou ao trabalho. “Eu desconfiei que estava infetado na madrugada de 6 de maio, porque tinha sintomas gripais (arrepios, suores e febre). “Fiz o teste e no dia seguinte soube que estava positivo e estive duas semanas em isolamento com sintomas ligeiros (febre, pequena cefaleia e diarreia) na primeira semana”, contou, acrescentando que depois de 14 dias voltou a fazer “dois testes, onde ambos deram negativo”.

Hugo Santos acha que apanhou o vírus no hospital porque na altura a sua vida era só “casa, trabalho e vice-versa”. “Tive a sorte de irem ao supermercado por mim”, adiantou.

Em declarações ao JORNAL DAS CALDAS, contou que durante duas semanas “lidei com a ansiedade e não tive medo”. O enfermeiro aproveitou o isolamento para “fazer teletrabalho e videoconferências por Skype” e isso ajudou-o “bastante a ultrapassar tudo, porque não estava focado na doença”.

Hugo Santos tratou-se só “com paracetamol, nomeadamente à noite para baixar a febre, porque durante o dia mantive o estado febril como mecanismo de defesa para que o corpo pudesse ele próprio combater o vírus e acho que foi isso que me ajudou”. “Já percebi cada pessoa tem um tipo de patologia e queixas, embora elas sejam generalizadas”, referiu.

O enfermeiro tem a sua residência oficial em Leiria, onde mora com os seus pais, mas como estava a trabalhar na linha da frente no combate ao novo coronavírus, mudou-se para as Caldas para “proteger os familiares”.

Tem agora mais sensibilidade para passar a mensagem de que apesar do desconfinamento é “preciso ter muito cuidado e minimizar os contatos sociais ao indispensável, uma vez que só isso nos permitirá voltar o mais rápido possível à normalidade”. Apela ainda que utilizem os recursos de saúde de uma “forma eficaz porque o que estamos a assistir é a Saúde 24 a encaminhar pessoas com sintomas ligeiros para a urgência e isso não se compreende”, aconselhando as pessoas a dirigirem-se ao centro de saúde.

Técnica de auxiliar de saúde Márcia Philippi, de 50 anos

Márcia Philippi, natural do Brasil, técnica auxiliar de saúde no hospital das Caldas há cerca de dois meses, recorda o momento em que soube que estava infetada com o novo coronavírus e os sentimentos que a invadiram, até “porque com 50 anos pensei que podia morrer”.

“Nunca pensei que estava infetada até porque os sintomas eram de sinusite, sem tosse e febre”, contou a auxiliar de saúde, que há sete meses se mudou do Brasil (Curitiba), onde já trabalhava na área da enfermagem, para as Caldas.

“Como os sintomas não passavam falei com o médico no hospital e ele mandou-me fazer o teste, mas eu nunca pensei que desse positivo”, relatou.

Foi desesperante quando percebeu nos meados de abril que estava mesmo infetada com a doença que se espalhava por todo o país e mundo. Ainda hoje não tem a certeza como ficou infetada até porque sempre cumpriu “todos os cuidados recomendados no hospital e em casa”.

Márcia Philippi entrou em confinamento doméstico, distanciando-se do marido e filha de 15 anos “à força de máscaras e de litros de lixívia, numa altura em que pensava que só acontecia aos outros”.

“Fiquei em quarentena em casa e depois os sintomas começaram a piorar, com dores de cabeça fortes, cansaço e dores nas pernas, e fui ao hospital, onde me foi diagnosticado o princípio de uma pneumonia por Covid-19 e sugeriram internamento”, contou.

Márcia Philippi ficou internada para observação de 24 de abril a 7 de maio no hospital de Torres Vedras, onde só tomou analgésicos. Agradeceu a assistência, que foi “espetacular”. “Se estivesse no Brasil não seria tão bem assistida como fui aqui”, referiu, deixando um grande agradecimento aos profissionais de saúde.

“A força do meu marido e da minha filha foi muito importante, foi a grande âncora da minha confiança para a recuperação”, frisou, adiantando que “ajudou-me a conviver melhor com a ideia “da separação da família e de não saber o tempo de internamento”.

A auxiliar não queria que a sua mãe no Brasil soubesse, mas “não foi possível porque ela pressentiu e ligou para o meu marido”. “Sempre fui falando com todos através do telemóvel, o que ajudou a ultrapassar o pior”, salientou.

Depois de fazer novamente os dois testes que deram negativo retomou o trabalho a 12 de maio.

Márcia Philippi deixa uma mensagem de apelo à população caldense para “ter cuidado”. “Estamos perante uma situação comum de se pensar que só acontece aos outros, e parece agora haver uma descontração muito grande, nomeadamente dos mais idosos, que estão na rua sem máscara a conversar sem distanciamento e por vezes a tocar na pessoa ao lado”, disse a auxiliar na área da saúde.

O seu marido, José Fumegalli, destacou que a delegação de saúde das Caldas da Rainha foi “incansável no apoio à minha família”. “Depois de sabermos que a minha esposa estava infetada eu e a minha filha fizemos o teste e apesar de dar negativo tivemos de estar de quarentena e os profissionais da delegação de saúde estavam sempre a telefonar a ver se estava tudo bem e inclusive tive agentes da polícia que iam ver se estava em casa a perguntar se precisava de alimentos”, revelou.

O casal brasileiro está preocupado com a evolução da pandemia no Brasil e “feliz por estar em Portugal nesta fase”.

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