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Criança assassinada tinha marcas de agressões anteriores

Romaria ao local onde Valentina foi abandonada morta

Francisco Gomes

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A zona onde o corpo da pequena Valentina foi abandonado, encoberto por arbustos, depois de ter sido barbaramente assassinada, está agora repleta de flores, balões e bonecos de peluche. Populares que por ali têm passado têm deixado mensagens.
Populares têm visitado o local onde o corpo de Valentina foi encontrado

“Agora que já estás com Deus, teu verdadeiro pai, descansa em paz”. “Tu sofreste até à morte por um monstro. Estamos a sofrer por ti”. São duas das várias mensagens deixadas na zona onde o corpo da pequena Valentina foi abandonado, no limite da freguesia da Serra d’El Rei, em Peniche.

Entre pinheiros e eucaliptos, a poucos metros da borda da estrada junto a uma bifurcação que dá acesso a empreendimentos turísticos e a uma propriedade particular, o local tem sido alvo de uma autêntica romaria nos últimos dias, por populares que têm deixado a sua homenagem à menina numa espécie de memorial improvisado, onde consta o nome de Valentina e a data de 6 de maio, em que foi morta pelo pai e abandonada pelo progenitor e pela madrasta.

O sítio onde o corpo foi deixado encoberto por arbustos, está repleto de flores, balões e bonecos de peluche. As pessoas que por ali passam emocionam-se.

O pranto de dor ora faz embargar a voz ou manifestar de forma emotiva a indignação por uma morte violenta às mãos de um pai e de uma madrasta que desfizeram os sonhos de uma menina de nove anos.

O crime tem revoltado o país e feito repensar o amor que se nutre por um filho.

“Custa-me muito, porque tenho uma netinha da mesma idade. É muito triste ter acontecido esta miséria”, desabafou Maria do Rosário, que se deslocou das Caldas da Rainha para rezar por Valentina. O marido, Lourenço Antunes, disse estar “muito comovido e não ter palavras” para descrever a sua dor.

Entre as mensagens deixadas, uma avó escreveu que “este caso tem-me emocionado muito. Um dos meus filhos tem uma menina que não é filha dele e para mim é acarinhada como os outros cinco netos”.

A construção de um memorial como forma de não deixar esquecido este crime hediondo, é uma ideia defendida por alguns populares, mas apesar da afluência de pessoas, não está prevista a criação de um memorial no local, revelou a junta de freguesia da Serra d’El Rei.

Pai e madrasta em prisão preventiva

As circunstâncias da morte de Valentina continuam a ser desvendadas dia após dia, tal qual um novelo desfiado e os contornos são cada vez mais chocantes à medida que se vão conhecendo os pormenores do crime que tirou a vida a esta menina, quando estava a passar algumas semanas na casa do pai e da madrasta, no Bairro do Capitão, em Atouguia da Baleia, no concelho de Peniche.

Segundo o que vem sendo tornado público, o relatório preliminar da autópsia revelou que a criança apresentava agressões anteriores às que provocaram a morte. Confrontado pelo juiz de instrução criminal do Tribunal de Leiria, o pai de Valentina, Sandro Bernardo, de 32 anos, natural de Peniche, terá confessado que a 1 de maio, cinco dias antes da criança ter morrido, lhe deu uma sova, alegando que a menina não queria contar-lhe se tinha sido vítima de abusos sexuais por um amigo da mãe a quem chamava padrinho, em troca de presentes, ou por colegas da escola.

O despacho de indiciação do Ministério Público, revelado pela revista Sábado, dá conta de que Sandro deu-lhe várias palmadas “com muita força” no rabo e nas pernas.

O assunto não terá ficado esquecido e perante o silêncio da criança no dia 6 de maio, por volta das 9h, terá levado a filha para a casa de banho, colocando-a na banheira, e usado o chuveiro para deitar água quente sobre o corpo dela, agredindo-a com um dos chinelos da criança.

O Ministério Público revela que o arguido também a terá asfixiado e “desferiu uma pancada com muita força, com as mãos, na cabeça da menor, na parte superior do crânio que lhe provocou uma hemorragia interna”. Adianta que tudo isto aconteceu com a madrasta, Márcia Bernardo, de 38 anos, a assistir e sem nada fazer para parar as agressões.

É o cenário para que aponta o exame no Gabinete Médico-Legal Forense do Oeste, em Torres Vedras. As causas da morte só serão confirmadas depois de exames laboratoriais.

Apesar das reservas na história de suspeitas de abusos sexuais relatada pelo pai, o Ministério Público vai abrir um inquérito para averiguar e perceber se não passarão de uma tentativa de desculpa para as violentas agressões.

Meio-irmão testemunhou

De acordo com o Correio da Manhã, o filho mais velho de Márcia, de 12 anos, terá ouvido tudo e foi à casa de banho onde viu a sua mãe e o padrasto com a menina já desfalecida. Mandaram-no ir para o quarto com a ameaça de que ficaria sem as irmãs (o casal tem duas filhas em comum, de quatro anos e sete meses) se contasse o que ali se passou.

Valentina desmaiou e o pai meteu-a no sofá tapada com um cobertor. Ali permaneceu treze horas. O pai e a madrasta chegaram a sair de casa. Quando voltaram, perceberam que a criança estava morta. O casal esperou que as outras crianças adormecessem para retirar o corpo de Valentina para escondê-lo num eucaliptal perto de Saibrais, na Serra d’El Rei, onde foi abandonada a alguns metros da estrada, tapada por arbustos.

A madrasta conduziu o carro, um Renault Scenic verde, com Sandro, dono da viatura, ao lado e Valentina morta. O casal escondeu o corpo e voltou para casa para engendrar a história do desaparecimento, que nos dias seguintes ocupou seis centenas de operacionais da GNR, bombeiros, proteção civil, escuteiros e voluntários.

No dia 7, pela manhã, o pai contactou a GNR de Peniche, dando conta que a filha tinha desaparecido.

Ao final da tarde o caso tornava-se público, através do Facebook, quando um tio da criança relatou que “ela saiu de casa pela manhã”, adiantando que “quando o meu irmão acordou ela já não estava em casa”. A menina tinha vestido “um pijama, chinelos brancos e um casaco azul”. “Não é a primeira vez que a menina foge de casa”, dizia ainda o familiar.

As buscas, alargadas ao perímetro da freguesia, levaram a palmilhar uma área de sensivelmente quatro mil hectares, mais do que uma vez em alguns locais, até à manhã de dia 10, quando o corpo foi encontrado.

Contaram com a utilização de cães pisteiros e com recurso a drones, para uma pesquisa aérea da zona, e no fim de semana envolveram grupos organizados com cerca de cem pessoas, em situações meteorológicas adversas e perante diversos obstáculos naturais.

“Estamos todos impacientes à procura da menina, é como procurar uma agulha num palheiro”. A declaração, emotiva, era de Afonso Clara, presidente da junta de freguesia de Atouguia da Baleia, e evidenciava que estavam a ser esgotadas todas as possibilidades para encontrar Valentina.

Enquanto ainda decorriam buscas, os familiares da criança, quer do lado paterno, quer o lado materno, divulgaram apelos nas redes sociais, no sentido de que se alguém tivesse informações sobre a menina contactasse as autoridades policiais.

Apesar de ser uma zona residencial ninguém se apercebeu de alguma situação anormal. A Polícia Judiciária, com inspetores e uma equipa forense, recolheu vestígios na habitação, para realizar exames periciais em laboratório. Os técnicos do Laboratório de Polícia Científica, unidade da Polícia Judiciária de apoio à investigação criminal, procuraram despistar a eventual existência de sinais de crime, um dos cenários que estava em aberto e que se veio a confirmar, num quadro de grande violência, em que menina foi espancada e torturada.

A investigação começou como um desaparecimento mas “as inquirições feitas a várias pessoas permitiram-nos fazer a correlação entre todos os dados que tínhamos em cima da mesa no sentido de colocarmos todas as hipóteses que seriam possíveis até encontrarmos indícios de condutas criminosas”, explicou Fernando Jordão, coordenador do Departamento de Investigação Criminal de Leiria da Polícia Judiciária.

Essencial terá sido o filho da madrasta. Ouvido para memória futura, terá descrito situações anómalas que observou e ouviu em casa, na altura da agressão à meia-irmã, o que levou os inspetores da Polícia Judiciária a pressionarem Sandro e Márcia, conseguindo assim saber que o corpo tinha sido escondido a vários quilómetros de distância da habitação.

Terão sido estes os factos, apresentados pelo Ministério Público, que levaram o juiz de instrução criminal a aplicar a medida de coação mais gravosa ao pai e à madrasta de Valentina: a prisão preventiva. Ambos estão fortemente indiciados pela prática de homicídio qualificado, no caso de Márcia por omissão com dolo eventual. Os dois suspeitos estão ainda indiciados do crime de profanação de cadáver. No caso do pai de Valentina é-lhe atribuído mais um crime, o de violência doméstica – por ter assumido que bateu na criança no dia 1 de Maio.

Os fortes indícios deste crime apontam para que a criança tenha morrido por intervenção direta do pai e que a madrasta tenha assistido e encoberto a morte.

O inquérito corre termos na 1.ª Secção das Caldas da Rainha do Departamento de Investigação e Ação Penal da comarca de Leiria e o Ministério Público é coadjuvado pelo Departamento de Investigação Criminal de Leiria da Polícia Judiciária.

Desmaio no funeral

O funeral de Valentina realizou-se no dia 12, no cemitério de São Brás, no Bombarral, vila onde a criança residia com a mãe, exceto quando passava alguns dias com o pai e a madrasta.

O caso motivou a revolta da população, enganada desde o primeiro momento em que se desencadearam as buscas pela menina.

O comandante dos bombeiros voluntários de Peniche, José Rodrigues, também confessou o “desalento” das forças operacionais que estiveram envolvidas em buscas, induzidas por um pretenso desaparecimento voluntário, quando afinal o pai e a madrasta já sabiam o que tinha acontecido.

O capitão Diogo Morgado, comandante do destacamento da GNR das Caldas da Rainha, relatou que o pai, que nunca participou nas buscas, procurou várias vezes saber onde é que estavam a ser feitas, para perceber se se encontravam perto do local onde o corpo foi abandonado. Às pistas falsas juntou a informação de eventual sonambulismo da criança, tentando causar confusão acerca dos cenários a investigar.

Durante o funeral, ao qual puderam apenas assistir familiares, muitas pessoas concentraram-se nas imediações do cemitério e ao longo do trajeto do carro funerário apresentaram-se com balões e flores.

A comoção levou Sónia Fonseca, a mãe da criança, a desmaiar, tendo sido levada de ambulância para o hospital das Caldas da Rainha, onde foi assistida. Nunca se pronunciou o bárbaro crime e tem-se refugiado na casa do namorado, um dj residente nas Caldas da Rainha.

A Junta de Freguesia de Atouguia da Baleia decidiu transmitir uma missa na internet em homenagem à menina, no dia do seu funeral.

Paternidade só após exames de ADN

A menina morava habitualmente com a mãe no Bombarral, e frequentava o 3.º ano da Escola Fernão do Pó, mas durante este período de quarentena devido à Covid-19, estava a passar uns dias em casa do pai.

Sandro tinha planeado emigrar para a Bélgica com a família (menos a Valentina). Já tinha estado naquele país a trabalhar e achava que ir para lá laborar no ramo da construção civil era mais rentável do que o emprego que chegou a ter na Thai Union Group (indústria conserveira de Peniche). A madrasta de Valentina não tinha agora nenhum emprego, ficando em casa a tomar conta das crianças.

Valentina cresceu sem a companhia do pai, que só reconheceu a paternidade após exames de ADN.

Mãe e pai fizeram vidas paralelas, cada um refazendo as suas vidas com outros companheiros. Na realidade, Valentina foi fruto de uma relação fortuita e os pais nunca tiveram uma vida em comum.

Quando Valentina passou uma temporada com o pai e a madrasta, numa casa que estes ocupavam no Bairro do Lapadusso, em Peniche, a menina desapareceu uma vez. Foi no ano passado, tendo sido encontrada pelas autoridades policiais junto à rotunda à entrada de Peniche, depois de ter percorrido a pé quase três quilómetros. Disse que tinha sentido saudades da mãe e que queria ir ter com ela.

Na altura o caso foi comunicado à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Peniche, mas foi arquivado posteriormente por se considerar que a criança não estaria em risco e por não estar referenciada por maus tratos. A CPCJ não aplicou quaisquer medidas de promoção e proteção.

Cortou-se com gilette

A madrasta da menina ficou em prisão preventiva na cadeia de Tires, enquanto que o pai foi para uma ala anexa ao Estabelecimento Prisional de Lisboa. O julgamento poderá demorar meses a ser realizado, tendo em conta a investigação e elaboração do processo, e possivelmente só acontecerá em 2021.

Na sexta-feira da semana passada Sandro foi para o Hospital de São José por apresentar feridas superficiais nos pulsos e braços, que fez utilizando uma gilette descartável. Foi assistido e enviado para a ala psiquiátrica do Hospital Prisional de Caxias.

Apelo a ajuda alimentar

A Mão Solidária de Peniche fez um apelo à doação de bens alimentares e produtos de higiene para as meias-irmãs de Valentina, à guarda provisória de uma tia.

“Esta tia está a fazer todos os possíveis para proteger e cuidar destas duas crianças, mas vê-se agora numa situação bastante complicada, uma vez que este acolhimento mexe com toda uma estrutura familiar à qual não estava preparada.

Papas, cereais, leite, iogurtes, fruta e fraldas nº 3 podem ajudar.

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