Em entrevista ao JORNAL DAS CALDAS manifestou preocupação com impacto desta crise nas empresas do ramo hoteleiro e com o setor da pesca.
JORNAL DAS CALDAS – Como é assistir a uma cidade em isolamento?
Henrique Bertino: O estado de emergência nacional foi decretado há tão pouco tempo, mas parece que passaram meses.
Falta gente, contacto, afetos e abraços. Em alguns momentos, especialmente no princípio e no final do dia, ao atravessar a ponte viária a pé, tenho a sensação de estar sozinho no mundo.
Mas o sentimento é de luta e de determinação para vencermos os maiores desafios das nossas vidas que são a sobrevivência e o conseguirmos salvar vidas através das ações que vamos tomando.
J.C – Como está a situação no concelho?
H.B.A: A situação epidemiológica no concelho de Peniche, no dia 29 de março, regista três casos positivos confirmados, 63 em quarentena.
J.C. – O Município instalou uma zona de acolhimento para vítimas infetadas. Como é que vai funcionar esse hospital de campanha?
H.B.A: Esta estrutura de acolhimento localizada em Peniche tem capacidade de trinta camas, reúne as condições indicadas pela Direção-Geral de Saúde, servirá de apoio aos hospitais da região e será ativada em caso de necessidade.
Temos esperança de que não haja necessidade de um hospital de campanha, mas a ser necessário este estará situado nas proximidades do Hospital São Pedro Gonçalves Telmo. Este hospital de campanha irá funcionar com a coordenação das entidades de saúde, com o apoio do Município, nomeadamente através da Comissão Municipal de Proteção Civil, a Associação de Bombeiros Voluntários e outras instituições.
J.C. – Peniche é uma zona de muitas praias. Com o bom tempo a chegar e com o Governo a prolongar o “estado de emergência” no país como vai proibir que as pessoas vão à praia?
H.B.A: Vamos aguardar pela evolução da pandemia para adaptar as medidas às exigências de cada momento e em função dos riscos de infeção e do comportamento das pessoas. A maioria da nossa população está cada vez mais consciente dos riscos e dos perigos que esta situação pandémica nos trouxe. Estou convicto de que os comportamentos da sociedade têm de se ajustar a esta nova realidade, mas esperamos que não haja necessidade de impor a proibição de idas à praia por muito tempo.
J.C. – Concorda com as medidas do Governo para apoiar as empresas?
H.B.A: No essencial concordo. No entanto, face à crise, considero que as exigências destas medidas de apoio, com o tempo, poderão revelar-se insuficientes. Assim, deverá existir rigor, objetividade, critério de atribuição direcionado e fugir de comportamentos demagógicos ou populistas que, em minha opinião, pareceu estar a acontecer.
J.C. – Como é que a crise está a afetar a indústria e as empresas instaladas em Peniche?
H.B.A: No concelho de Peniche verifica-se que algumas empresas continuam a laborar, mas adaptaram o seu funcionamento à exigência do momento, implementando medidas preventivas. No sentido de minimizar os impactos económicos desta crise nas empresas instaladas no nosso concelho vamos estar atentos e iremos intervir de forma adequada a cada situação.
Preocupa-nos muito o impacto desta crise nas empresas do ramo hoteleiro, da restauração, das áreas ligadas às atividades marítimo-turísticas, da “indústria” das ondas, enfim, do turismo na sua generalidade.
J.C. – Os pescadores de Peniche estão a garantir o peixe fresco. Quais as principais dificuldades que estão a enfrentar?
H.B.A: Os pescadores de Peniche continuam a pescar e deparam-se que muitas dificuldades. Aquando a bordo das embarcações as tripulações correm riscos de infeção pela proximidade com que trabalham e das limitações das condições a bordo. Depois, o setor enfrenta sérias dificuldades provocadas pela quebra na procura e no preço do pescado em lota e que resultam numa redução dos rendimentos das empresas e dos trabalhadores, mas também na redução da rede de comercialização dos produtos do mar.
Estão na expectativa e naturalmente que também apresentarão um caderno reivindicativo em consonância com os impactos negativos em consequência da crise.
J.C. – O setor do turismo, nomeadamente os hotéis e restauração de Peniche, é que está a sofrer mais?
H.B.A: Sim, é um setor atingido de forma muito significativa e preocupante. O cancelamento de reservas nas unidades hoteleiras, no alojamento local e outros, mas também o encerramento de restaurantes, poderão pôr em causa diversos postos de trabalho no nosso concelho, e em alguns casos a própria existência das empresas.
Veremos até que ponto as medidas anunciadas pelo Governo poderão, efetivamente, ajudar a superar esta crise e apoiar empresas e trabalhadores. Teremos, também, de avaliar que medidas complementares poderão ser implementadas pelo Município de Peniche de forma a ajudar para uma rápida recuperação. Pretendemos intervir para que nenhuma empresa fique para trás e para minimizar o desemprego.
J.C. – Qual é a perspetiva da Câmara na diminuição de receitas?
H.B.A: De momento ainda não conseguimos quantificar o impacto da crise nas receitas. A diminuição das receitas vai depender da duração desta pandemia e a recuperação vai depender da nossa capacidade de reação e da dinamização económica do concelho. O fator tempo será determinante.
J.C. – Além das medidas do Governo de apoio às empresas o Município tem algum plano para ajudar a minimizar os prejuízos?
H.B.A: Sim. Estamos a trabalhar num plano para ajudar a minimizar os prejuízos das empresas no nosso concelho, para isso estamos a elaborar um Plano de Emergência Municipal. Não será fácil, por vezes a tendência é implementar medidas populistas ou demagógicas. Este momento difícil exige boas decisões e boas medidas.
Foram já preparadas várias propostas conjuntamente com os vereadores da Câmara Municipal e, também, com a Oestecim. Há um grande esforço de concertação de esforços e de medidas.
J.C. – Estão a estudar a hipótese de famílias e as empresas do concelho ficarem isentas do pagamento da fatura da água?
H.B.A: Face à quebra de rendimentos das famílias e empresas do concelho, estamos a avaliar e a procurar estabelecer medidas direcionadas para quem efetivamente precisa.
Devemos ter em consideração que os recursos financeiros não são ilimitados e não podemos facilitar. Não é aconselhável ceder às pressões para diminuir ou para isentar o pagamento da fatura da água para a generalidade da população.
Por exemplo, no meu caso não tenho necessidade que me isentem do pagamento da fatura da água ou de uma redução do valor a pagar. Certamente que há uma parte substancial da população que felizmente também não carece deste apoio, mas existem outros que passarão a necessitar deste apoio durante mais tempo. O mesmo se aplica no que diz respeito ao apoio às empresas. Devemos concentrar-nos em quem efetivamente precisa.
J.C. – Está a trabalhar em casa através reuniões em videoconferência?
H.B.A: Não estou a trabalhar em casa. Tenho estado a trabalhar todos os dias na Câmara, com um número muito restrito de colaboradores e em estreita coordenação com o comandante da Proteção Civil, que tem sido inexcedível.
As reuniões da comunidade intermunicipal, a Oestecim, e da Câmara têm sido realizadas através de videoconferência.
O meu obrigado a todos os que têm trabalhado para que a Câmara Municipal continue a servir a população.
J.C. – Que mensagem quer passar à população nesta altura difícil?
H.B.A: Apelo à população para que, sempre que possível, fique em casa. O isolamento social é fundamental para travar esta pandemia. Vamos ter esperança de que os piores cenários não se verifiquem e que todos sairemos mais fortes depois desta luta pela vida. Vamos acreditar que este é um momento das nossas vidas, o qual teremos de enfrentar com responsabilidade. Vamos ter esperança no futuro e, no momento após a crise, vamos procurar reagir com muita força e determinação.
Espero que saiamos mais fortes e, simultaneamente, mais sensíveis e que possamos aprender com esta lição.
Quero ainda agradecer a todos os profissionais, homens e mulheres, que trabalham diariamente para servir a população de Peniche, os do Município e todos os outros que o fazem.
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