Esta vila possui muitos dos atributos de qualquer vila histórica da Europa, porém, sinto-a muito mais “viva” do que outras similares. É um local excelente para desentorpecer a mente e as pernas, primeiro porque desfruta de uma atmosfera muito sugestiva, segundo porque o concelho (não só dentro das muralhas) possui uma população afável e bem-disposta. As suas vias – refiro-me àquelas pouco frequentadas por automóveis – são de uma placitude impressionante. Quanto mais nos embrenhamos pela Óbidos desconhecida, mais vontade temos de não sair dali. Obviamente, um dia, a política vendida aos interesses financeiros, poderá destruir o que de belo existe. Resta à população organizar-se, para proteger o seu riquíssimo património secular edificado, e os seus caminhos encantadores e centenários, bens que poucas regiões possuem. Quem tiver tempo e paciência pode percorrer longas distâncias, e, quem sabe, pelo meio, ir de encontro a alguma joia local, como, por exemplo, a Ermida de Nossa Senhora do Carmo. Assentada além portas, na vertente do flanco oeste. Consta que o seu nascimento dissipa-se no tempo. A sua memória histórica sustenta ter sido um delubro romano devotado a Júpiter, existindo, inclusive, a reminiscência de terem subsistido nesta igreja várias campas com epitáfios romanos. Chegou a ser sede da matriz de São João Baptista (do Mocharro) até 1636, ocasião em que se mudou para a senecta Ermida de São Vicente dos Gafos no pórtico austral da Vila, permanecendo a partir dessa data com a atual exoração de Nossa Senhora do Carmo. Este monumento foi, também, imensamente prejudicado pelo terramoto de 1 de novembro de 1755. Depois de recuperado, pervagou pelos anos afora sem a devida atenção histórica, atualmente, tanto os obidenses quanto os visitantes desconhecem-no, bem como ao seu valor histórico-cultural. Para piorar, em termos de manutenção, encontra-se um pouco desprezado. Quanto à provecta efígie do orago, São João Baptista – uma relevante peça escultórica de meantes do século XV, de plausível proveniência coimbrã, que esteve no seu interior – acha-se hoje no Museu Municipal de Óbidos. Na vanguarda, do lado de fora desta Ermida, ergue-se a torre sineira medieva que, felizmente, tem aguentado as intempéries. Óbidos é assim, por onde andamos encontramos algo que nos enche a vista e conforta a alma. Esta região é conhecida desde o ano de 308 a.C.. Fico a matutar acerca dos nossos ascendentes: Imagino-os, por esses séculos afora, a caminharem por essas plagas, ou a fazerem grandes percursos em carros-de-bois, entre as lides diárias. Vejo-os a pescar, quando a Lagoa chegava perto das muralhas. Os olhares a pervagarem o infinito. Os celtas, os romanos, os visigodos, os mouros, os moçárabes, cada um em sua época, a vivificarem a terra. Imagino Eburobrittium, e todo o movimento circundante…mas isto é assunto para depois. O dia é de sol, instalado num inverno pouco rigoroso na hora em que me encontro. Ouço o zunzunar das abelhas, a sede impele-me a puxar pelo cantil e a seguir na caminhada. Desta feita, sob a proteção de São João Baptista.
Rui Calisto
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