Era uma rapaziada que gostava de receber outros amigos – vindos dos mais diversos quadrantes do concelho e, ali, como dignos representantes do nosso bairro, jogando com as cores leoninas – e ostentando garbosamente o nome de “Leões da Ponte”, “dar-lhes uma cabazada”.
Foi em madrugada recente, envolto em pensamentos passadistas, que me recordei, com muita saudade, daquela trupe. Não me fazendo de rogado vasculhei alguns álbuns de fotografias e encontrei resquícios daqueles destemidos e valentões craques. O Desconhecido já levou alguns, outros vivem fora do país, meia dúzia está espalhada por Portugal, e há aqueles que, quando estou pelas Caldas da Rainha, encontro com facilidade. O cumprimento – festivo – continua a ser o da adolescência; As palavras mantêm aquele toque de galhofa; E o olhar, mútuo, o de quem respeita e admira.
A região onde estava situado o “estádio” do Salgado possui agora um conjunto de infraestruturas, comerciais e habitacionais. É um local frio, sem emoção, sem ponta de história desportiva atual. Não gosto de por ali passar, mas, quando o faço, vêm-me aos olhos disfarçadas gotas de chuva fina, que se vão embora acompanhadas de um soluço arisco e teimoso.
Antigamente saltava à vista a extensão de pinhal existente naquela região, bem como a quantidade de aves que passavam por cima das nossas cabeças, eram enormes bandos de bicos-de-lacre, pintassilgos, melros-pretos, chapim-azul, chapim-real, chamariz, tentilhão-comum, verdilhão, pardal-comum, andorinhas-dos-beirais e andorinhas-das chaminés. Hoje não há ali pinhal que se possa destacar, e quanto aos pássaros, coitados, foram engolidos pelo “progresso”.
Os dias de semana eram preenchidos com aulas, muita leitura e recatados namoricos. Os fins de semana eram predispostos à pesca, a ir ver o Caldas S. C., e às jogatanas no Salgado. Algumas vezes, especialmente aos sábados, acontecia a extravagância do teatro e dos passeios pela Capital, outras vezes, ainda em Lisboa, nós os sportinguistas acompanhávamos os benfiquistas ao Estádio da Luz e, quantas vezes, os adeptos das águias iam connosco ao velhinho José de Alvalade. Com certeza, depois de ver os dois grandes, sentíamo-nos preparados para repetir as jogadas, no fim de semana seguinte, no nosso “estádio” do Salgado.
Sim, fomos muito felizes!
A rapaziada dos nossos dias não joga à bola na rua, não convive com a natureza, e acha que a vaca castanha dá leite achocolatado (risos). Não conhecem o bairro onde moram, não dão a mínima importância à história do seu concelho e desconhecem, completamente, as espécies de pássaros que citei acima. A malta de hoje, infelizmente, não tem diante de si o “nosso” Salgado.
E antes que a chuva regresse à face, vou abrir uma garrafa de tinto e brindar aos meus amigos, a todos eles. Pela nossa memória. Pela alegria de ter feito parte daquela história!
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