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Tiago Mileu um jovem prodígio no piano dá concertos no Museu Malhoa

Marlene Sousa

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Com 14 anos, Tiago Mileu foi considerado um dos melhores pianistas nacionais. Há dez anos atrás o seu talento deu-lhe fama e levou-o a atuar nos grandes palcos portugueses e na Europa. Participou em concursos internacionais e foi premiado como solista várias vezes.
Com 14 anos, Tiago Mileu foi considerado um dos melhores pianistas nacionais

Por motivos de força maior, parou de tocar piano oito anos, de 2008 a 2016, vivendo como “um eremita, sem telemóvel, telefone, televisão…”.

Natural de Portalegre, em 2014 mudou-se para as Caldas da Rainha onde vive com a sua mãe na Foz do Arelho.

Em 2016, “quebrou o gelo” e a “neve da avalanche”, e começou a tocar no Museu José Malhoa.

Aos 25 anos o prodígio do piano quer voltar a ser um pianista de sucesso.

Durante o mês de julho aos sábados à tarde, o músico deu recitais de Beethoven no Museu José Malhoa.

Os concertos de piano com Tiago, regressam ao museu no dia 3 de setembro com Beethoven. O músico vai continuar com os recitais daquele compositor todos os domingos, sempre às 15h00. O preço da entrada é o do bilhete normal de entrada no museu.

Em entrevista ao JORNAL DAS CALDAS, o jovem revela que a sua ambição num futuro passa por “dar o meu melhor, sempre”.

Aos 14 anos, Tiago Mileu, exibia um alto nível nos maiores palcos nacionais para além dos sucessivos êxitos no estrangeiro. As televisões nacionais cobriram e deram destaque a alguns concertos.

Não cresceu numa casa de músicos, mas desde sempre aprendeu ouvir música clássica. O gira-discos da sala tocava sonatas de Beethoven que a mãe comprava com alguma frequência. Foi por influência da mãe que ingressou no Conservatório Regional de Portalegre aos 8 anos. “A minha mãe sempre acreditou nos benefícios da música – dizia ela que ajudaria a desenvolver a memória”, recordou o jovem, acrescentando que a “musicoterapia está a conquistar um lugar firme e há cada vez mais pessoas à procura da música para modificar o estado de espírito, trazer motivação, procurar compreensão, companhia, beleza, alívio, enfim…… A aproximação à música, é intuitiva em nós, não é história recente”. Tiago Mileu nasceu em Portalegre a 29 de março de 1992. “É o 88º dia do ano, e o piano tem oitenta e oito teclas. No dia 1 de outubro de 2000, as minhas mãos tocaram pela primeira vez num piano, tinha eu oito anos”, apontou, o jovem.

Viveu no Fundão dez anos, de 2004 a 2014. Foi aluno de piano no Conservatório Regional de Portalegre (agora Escola de Artes do Norte Alentejano) de 1 de outubro de 2000 até ao final do ano letivo de 2003/2004. Foi lá onde estudou mais piano porque, diz, foi lá que “encontrei um elo com a minha sensibilidade, com o seu ser”.

Lembrou que o Conservatório tinha como política pôr as crianças, desde cedo, a apresentarem-se em público. A primeira audição em que participou, juntamente com os seus colegas, foi em 2000, pelo Natal. Em 2003, já se apresentava em público em diversos locais da cidade. “Convidavam-me frequentemente para ilustrar com “momentos musicais” os mais diversos acontecimentos. Algo como um recital, a solo, só em 2003 com onze anos”, contou.

Tiago Mileu tem “ouvido absoluto”

Tiago Mileu tem “ouvido absoluto” – fenômeno auditivo, geralmente considerado raro, que se caracteriza pela habilidade de uma pessoa identificar ou recriar uma dada nota musical.

Segundo o músico a denominação inglesa é “perfect pitch” para ser um pouco mais “exato”. “O “ouvido absoluto” nada tem a ver com o ouvido. Beethoven tinha-o, e viveu completamente surdo demasiados anos da sua vida. Digamos que é uma estratégia de recognição de frequências sonoras, involuntária. A sua denominação variará com a nomenclatura e características do sistema musical aprendido”, explicou, o jovem. No “ouvido absoluto”, disse o jovem, o “reconhecimento é imediato e exato – algo como olharmos para uma planta e sabermos imediatamente que àquela cor chamamos verde”.

No “ouvido relativo” a identificação é, segundo Tiago, feita através do “raciocínio, por comparação a um som que serve como referência e que o ouvinte sabe, ou arranja maneira de saber, qual é”. Também ele “aciona” o ouvido relativo quando quer fazer uma “transposição, ou seja, fazer uma conversão para mais agudo, ou grave, daquilo que está a ouvir. Por fim, diz que há muitas teorias e ideias sobre o “ouvido absoluto”.

O músico encontra alguma concordância com os textos de um neurocientista americano que acredita que o “ouvido absoluto” pode “desenvolver-se e aprender-se”. Não aceita o “facilitismo dos que o “empurram para algo genético intransmissível. Uma matéria muito interessante para reflexão e estudo, sem dúvida”, apontou.

Com apenas 14 anos de idade, o pianista Tiago Mileu arrecadou já diversos prémios, entre eles, o 1º prémio do Concurso Internacional de Piano de San Sebastián (2005), o 2º prémio do Concurso Alexandre Scriabin (Paris, 2005) e o 1º prémio do Concurso de Piano “Compositores de Espanha”(Vigo, 2005). Foi também premiado na Polónia.

No seu currículo conta também com diversos concertos a solo no Centro Cultural de Belém e no Teatro São Luís.

O prémio que lhe marcou mais foi o que recebeu em Vigo (Galiza – Espanha) em 2005. “Tinha treze anos. Concorri numa categoria até 18. Do júri fazia parte o compositor, Antón García abril. As partituras das suas obras chegaram tarde, tive apenas treze dias para as preparar, ganhei o primeiro prémio e o prémio de melhor intérprete das suas obras”, contou.

Para Tiago Mileu, tocar para o “compositor, enfrentar e ousar exprimir o que eu sentia com a sua obra, para depois ser reconhecido daquela forma, ouvir e ler o que o compositor disse a meu respeito foi extremamente forte, e marcante, para mim”.

O jovem lembrou as palavras de Antón García abril em relação à sua interpretação. “Ouvir-me tinha sido descobrir um grande artista; que sabia aliar a técnica às intuições musicais que a minha sensibilidade me proporcionava; que ele tinha ficado surpreendido com a visão madura que eu tive ao interpretar as suas obras”. Foi, para Tiago, algo que o ajudou a acreditar em “si mesmo”.

A sua opinião em relação aos “fenómenos” dos “meninos prodígios” nem sempre é a “mais calorosa”. “Procuro ouvir quem ama a música. Procuro envolvimento, entrega e paixão”, sublinhou, adiantando que se sente fascinado quando encontra mais alguém que “nutre o amor pela música”.

“Agora, ouço frequentemente associar o “prodígio” a algo diferente: crianças que são treinadas desde muito cedo, objetos de disciplina férrea, e que, por conseguinte, tornam-se hábeis, capazes de conciliar uma performance técnica de adulto com a sua idade infantil”. “O que a criança possa querer expressar, sentir, gostar, amar, não existe. Existe uma estratégia, com objetivos em vista, de um ou vários adultos que acompanham a criança”, adiantou.

O jovem músico inspira-se numa multidão de figuras “colossais da História da Humanidade”. “Sinto-me inspirado pelo que está à minha volta. Qualquer pessoa pode ensinar-me algo valioso”, apontou. “A inspiração que advém de um acontecimento, uma reflexão, contemplação, é tanta quanta aquela que procuro, de livre vontade, encontrar em algo que não conheço e quero começar a desvendar – seja o que for”, adiantou, o pianista.

Adora tocar Chopin, porque a sua música “sensibiliza o toque, incentiva quem a estuda a encontrar uma infinidade de nuances e dinâmicas”.

Quer centrar-se, para já, em cinco compositores: Mozart, Beethoven, Schubert, Chopin e Schumann. “Mozart nasceu em 1756, Schumann faleceu em 1856. Irei dedicar-me a este século nos tempos vindouros”.

Aprendeu a dura lição da vida

Por motivos de força maior, parou de tocar piano oito anos de 2008 a 2016. “A minha mãe adoeceu, foi internada no Hospital, fiquei aos 16 anos sozinho em casa. Foi o grito que provocou uma avalanche. Outros acontecimentos, como termos que mudar de casa repentinamente, para um bairro sénior em que não podia fazer-se barulho… Frustrações amorosas, sentimentos de culpa, tensões a nível estético com os meus professores, receios, stress acumulado de uma vida de frenesim”, contou.

Tiago disse que desistiu de tudo, de todos e de “mim mesmo”. “Fugi, escondi-me. Precisava de tempo para pensar, refletir. Vivi como um eremita: sem telemóvel, telefone, televisão”. Fazendo uma espécie de quadro-clínico-síntese, teve uma “depressão que não foi acompanhada, por isso perdurou até que eu encontrasse, passo a passo, o apoio para a vencer”.

Em 2016, finalmente respirou: “à superfície, quebrei o gelo e a neve da avalanche, e comecei a tocar novamente”.

Foi para Tiago tudo “muito importante” e, ousa dizer, não mudaria nada na sua vida. “Dei-me tempo para me encontrar – o meu sentir, não são muitos os que têm esse privilégio”.

Reside na Foz do Arelho desde 2014

Tiago mudou-se para as Caldas da Rainha e vive com a sua mãe na Foz do Arelho desde 2014. Conhecia (virtualmente) a Foz do Arelho, porque a saudosa “Viscondessa de Morais expressou interesse em ouvir-me e apoiar-me nos meus estudos universitários, em 2006”. Por diversos fatores, nunca chegaram a encontrar-se, mas ficou lá o “bichinho” da Foz do Arelho. “Depois de um tratamento que durou anos e que lhe deixou inúmeras mazelas, viver ao pé do mar significa para ela a esperança de dias melhores. Sente-se bem na Foz do Arelho”, referiu. A sua ligação com o Museu Malhoa surgiu em 2016. Já nas Caldas da Rainha com vontade de voltar a tocar, Tiago precisava de treinar num bom piano, e o dele não é afinado desde 2007. “Às vezes é difícil, para mim, ter que praticamente fazer um desenho para explicar que, embora seja pianista clássico, não sou o filho pródigo de uma família endinheirada”, sublinhou.

Segundo o músico, chegou a viver, com a mãe, abaixo do limiar da pobreza – durante um longo período. “Escrevi para o Museu, e telefonei. Fui prontamente e amavelmente atendido pelo diretor, o Dr. Carlos Coutinho. Ficou a par da minha história e percurso, e disponibilizou o piano de ¼ de cauda que o Museu dispõe – para eu treinar e ambientar-me às pessoas simultaneamente. Assim o fiz, mesmo com interrupções por motivos de saúde, passei a tocar semanalmente no Museu, de maneira informal”, explicou.

No dia 27 de maio deste ano, deu o meu primeiro recital público em dez anos – com a “integral dos Noturnos de Chopin” no Museu José Malhoa.

Vai também este ano dar aulas de piano naAcademia de MúsicadeCaldas da Rainha onde garante dedicar-se de “corpo e alma”.

Quanto à sua ambição como pianista, quer sentir que tudo fez para chegar “ao cerne das emoções e ao íntimo inacessível de quem ouve – fazer alguém sentir-se contemplado, compreendido, identificado”. “Ambições corriqueiras destroem a tranquilidade, e são de valor dúbio para mim. Que o meu instinto dite o rumo, que a necessidade o modere e amadureça”, sublinhou.

Reconhece o valor dos artistas portugueses, referindo que o “sucesso atrai é geralmente um modelo de negócio em que se entrecruzam interesses que o sustentam”. “Precisamos de um sucesso com mais humanidade. Oportunidades, quando não existem, criam-se. E criatividade não nos falta”, afirmou.

Marlene Sousa

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