Lino Romão, de 46 anos, candidato do Bloco de Esquerda (BE) à Câmara das Caldas foi o primeiro candidato a responder às questões. Expõe as suas intenções para a gestão da autarquia e apresenta as suas propostas e prioridades para o concelho.
Natural do Painho (Cadaval) reside na cidade termal desde os oito anos. Licenciado em Animação Cultural pela ESAD, Lino Romão foi livreiro durante 10 anos nas Caldas e atualmente trabalha na empresa municipal Óbidos Criativa na organização de eventos.
Para o cabeça de listado Bloco a atual gestão camarária é uma “grande desilusão”. “As entidades “satélite” como o CCC ou o Centro da Juventude, entre outras “barrigas de aluguer” servem para desorçamentar a autarquia. É a Câmara que responde por essas contas, como se viu há pouco tempo pela reaquisição do pavilhão da Expoeste pelas dívidas do respetivo satélite”.
JORNAL DAS CALDAS – Nas últimas eleições legislativas o Bloco de Esquerda cresceu eleitoralmente. Com a coligação da esquerda o BE tornou-se uma força do Governo. Que balanço faz do Bloco de Esquerda nas Caldas da Rainha?
Lino Romão: O BE nas Caldas tem acompanhado o crescimento nacional. As votações nos dois atos anteriores acompanharam a percentagem média Nacional. Há mais participação organizada e uma capacidade ativista crescente. Ainda assim não concorremos a todas as freguesias porque definimos o critério de concorrer apenas em freguesias com pessoas naturais ou residentes nessas mesmas freguesias. Temos uma votação assinalável nas freguesias do interior, mas infelizmente poucas pessoas disponíveis para protagonizarem candidaturas.
J.C. – O BE quer ser uma alternativa nas Caldas da Rainha? Acredita que este é o seu tempo?
L.R.: O programa do BE é claramente um programa alternativo: sério, credível e exequível. A experiência nacional demonstra que a força eleitoral do BE faz a diferença. Foi a força eleitoral do Bloco que permitiu viabilizar um governo na Assembleia da República.
Foram os orçamentos influenciados pela esquerda que devolveram rendimentos às pessoas e colocaram o país de volta ao crescimento económico. Acredito que os cidadãos percebem que o Bloco é do seu tempo e que também pode fazer a diferença nas autarquias.
J.C. – Como avalia a gestão camarária atual?
L.R.: Uma grande desilusão. Não que tivesse grandes ilusões com a continuidade do PSD à frente dos destinos caldenses após três décadas. Há um paradigma que se esgotou e são visíveis os problemas por ele provocados.
A cidade cresceu desordenadamente, enquanto as freguesias rurais foram deliberadamente atrofiadas. Há excesso de casas e lojas vazias e insiste-se em construir mais. Aprova-se tudo, sem critério nenhum. O comércio local está exangue e literalmente cercado pela grande distribuição. A Zona Industrial continua a ter um ar abandonado e pós-apocalíptico. No litoral há construção para a especulação turística, mas não há renovação de população residente. Algumas rotundas, e o pseudo-parque-tecnológico, mais parecem zonas de caça associativa.
A Câmara não tem pessoal suficiente para zelar o espaço público, que continua ostensivamente desmazelado
J.C. – Que mudanças pretende implementar?
L.R.: Esta Câmara tem um problema de excesso de concentração executiva nos vereadores do PSD. Falta mais competência operacional. É preciso contratar mais pessoal em todos os setores: mais técnicos qualificados e dar-lhes meios e competências, definindo objetivos e prazos. Veja-se como se fez em alguns municípios bem próximos e os resultados obtidos.
O PSD caldense é “controleiro” e não sabe delegar competências exigindo consequências. É uma pequenez muito pequenina que tem feito atrasar as Caldas, em comparação com outros concelhos.
J.C. – Qual é a sua prioridade para o Concelho das Caldas da Rainha.
L.R.: Há duas que se destacam: O desassoreamento da Lagoa de Óbidos através de uma dragagem permanente. A Lagoa de Óbidos é o nosso principal recurso ambiental e como tal deverá merecer uma atenção especial. E a construção de um novo hospital regional: prioridade identificada há já alguns anos e que tarda a arrancar. Tem de avançar no atual quadro comunitário e o mais depressa possível, por ser uma obra complexa que pode levar oito a dez anos a ser concluída.
J.C. – Quais são os principais problemas das Caldas da Rainha que gostava de ver resolvidos?
L.R.: Além das duas prioridades da pergunta anterior, temos a questão central do hospital termal e do termalismo em geral. A requalificação da Linha do Oeste. A impermeabilização da barragem de Alvorninha. Caldas também precisa de um programa de habitação acessível: há cerca de 30 pessoas a viver na rua ou em prédios abandonados; há famílias carenciadas e idosos que merecem uma habitação digna; há jovens famílias e jovens licenciados da ESAD que se querem fixar nas Caldas e a autarquia deve ter um plano habitacional que lhes dê resposta.
O mercado de habitação tem cerca de 3000 casas vazias nas Caldas mas é incapaz de satisfazer estas franjas populacionais. É aqui que entra a política de habitação.
J.C. – Caldas da Rainha tem-se afirmado nos últimos anos com a realização de diversos eventos e iniciativas com bastante projeção, como por exemplo o Oeste Lusitano, Feira dos Frutos, iluminação de Natal. Estes eventos são sustentáveis? E podem sê-lo no futuro?
L.R.: Os eventos são uma forma imediata e eficaz de trazer gente e afirmar os territórios. Numa altura que se fazem eventos por todo o lado é preciso algum rigor na avaliação dos resultados de afirmação e projeção. Cai-se facilmente na armadilha da reprodução de um certo discurso oficial triunfalista. Há meios e instrumentos para medir os impactos dos eventos que devem ser convocados. Os eventos das Caldas sofreram uma interrupção demasiado prolongada e ainda têm um grande salto a dar para voltarem a ser referências nacionais. A sustentabilidade futura depende de duas coisas:1.profissionalismo na organização; 2.aprendizagem com as experiências anteriores.
Efetivamente a Feira dos Frutos está melhor que a do ano passado. Está no bom caminho como certame temático e de verão. Só é pena que o orçamento municipal sirva para financiar um festival de música de verão, à custa do desinvestimento noutros setores tão carenciados e nas freguesias em geral. Financiar concertos com bandas de renome, que custam caro, não é apoio à cultura: é populismo e chama-se caça ao voto. É uma vergonhosa campanha eleitoralista do PSD com os meios da autarquia.
J.C – A maior parte das câmaras municipais em Portugal atravessam dificuldades financeiras. Considera que a autarquia das Caldas tem uma boa gestão financeira?
L.R.: Saiu há dias o anuário da gestão autárquica e o aspeto mais visível em relação a Caldas é que duplicou o tempo médio de pagamento a fornecedores de 2015 para 2016.
Em ano de eleições e com empréstimos “fresquinhos”, calculo que as coisas tenham melhorado, mas é evidente que há dificuldades. As contas foram muito bem “maquilhadas” e bem escondidas nos mandatos do anterior presidente. Mesmo atualmente as entidades “satélite” como o CCC ou o Centro de Juventude, entre outras “barrigas de aluguer” servem para desorçamentar a autarquia. Mas depois, na prática, é a Câmara que responde por essas contas, como se viu há pouco tempo pela reaquisição do pavilhão da Expoeste pelas dívidas do respetivo satélite. E de que serve uma “boa gestão” sem investimento? Sem pessoal suficiente para prestar os serviços? Com uma cidade com limpeza urbana deficiente? Sem qualquer cuidado com as bermas de estrada por todo o concelho? A “boa gestão” é apenas mais um truque de retórica.
J.C – O que diria a um investidor para escolher Caldas da Rainha para investir?
L.R.: Diria ao investidor público – Estado, que o investimento num novo hospital regional em Caldas da Rainha é absolutamente essencial e prioritário. Diria a um investidor privado outra coisa. Depois de saber de que tipo de investidor e de investimento estamos a falar – há aqui também outra armadilha ideológica no discurso, em que todo o investimento é bom por natureza e nem sempre é assim. Há investimento que é absolutamente oportunista e predatório de recursos ou que não respeita direitos laborais, outro que vem promover distorções sociais e concorrenciais: veja-se a cintura de hipermercados à volta da cidade. Se fossem menos o comércio e mercados tradicionais estariam mais pujantes o que seria melhor para o consumidor.
A um bom investidor diria que fosse prudente, e que tudo pode vir a correr bem apesar do arcaísmo do atual poder autárquico.
J.C – Considera que o termalismo nas Caldas da Rainha vai voltar a nascer, como prevê o atual executivo camarário.
L.R.: Espero que o termalismo renasça. Será provavelmente um processo tortuoso com alguns avanço e recuos. Tenho muitas dúvidas sobre a conceção do atual executivo. Veja-se o regozijo que se sentiu pelo projeto da Visabeira, que pelo que se conhece é muito desajustado ao contexto ambiental e arquitetónico em que se integra, e pela escala e posicionamento, completamente de costas voltadas para a população.
Há que procurar projetos de qualidade e sustentabilidade que promovam a coesão do termalismo com os caldenses.
Marlene Sousa
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