Os “felizes” ainda estão associados a padrões comerciais, portanto, costumam ser idealizados – e por norma desacreditados. É como se fossem marcianos, só que não são verdes. Por tudo isto, damos mais crédito aos angustiados, aos irônicos, aos pessimistas. Porque não aparentam possuir vínculo com essa tal de felicidade, dão a entender que têm uma vida mais profunda, mais verdadeira.
Já agora, por acaso, é feliz? Se é, não ande a espalhar por aí…. já que existe tanta gente que se sente incomodada com isso.
Mas também não se culpe, porque felicidade é uma coisa bem diferente do que ser linda, rica, simpática e aquelas coisas todas. Felicidade, se eu não estiver muito enganada, é ter a noção da precariedade da vida, é estar consciente de que nada é fácil, é tirar algum proveito do sofrimento, é não se exigir de forma desumana e, apesar (ou por causa….) disso tudo, conseguir ter um prazer quase indecente em estar vivo.
Uma vez uma psiquiatra minha conhecida dizia-me uma coisa no meio de uma conversa, que eu nunca mais me esqueci: “Dulce, ser feliz não é tão importante assim, mais vale ter uma vida interessante”. Penso que ela estava rejeitando justamente esta busca pelo “kit felicidade”, composto por meia dúzia de realizações convencionais.
O ter uma vida interessante é outra coisa: é cair e levantar, é poder movimentar-se, relacionar-se com as pessoas, não ter medo de mudanças, encarar o erro como um caminho para encontrar novas soluções, ter a devida “lata” de se testar noutros papéis, ou seja sair da sua zona de conforto para conhecer e experimentar novas coisas…e humildade para abandoná-las se não derem certo. Uma vida interessante é outro tipo de vida feliz: a que passou ao lado dos contos-de-fada. É o que nos faz ter uma biografia com mais de 12 páginas.
E se acredita que ser feliz compromete o seu currículo de intelectual sedutor, troque por outro termo, mas nunca cuspa nesse prato. Embriague-se de satisfação íntima e justifique-se se lhe apetecer, dizendo que é um louco/a, apenas isso. Como todos nós sabemos, os loucos encontram sempre as portas do céu abertas.
Lembram-se de uma letra de uma musica de há uns anos atrás (gente da minha geração) da Rita Lee (ela, que tem passado por muitas e boas coisas) mas nunca se queixou e acha ou achava que tinha uma vida interessante, e que era feliz; “Se eles são bonitos, eu sou o Alain Delon/se eles são famosos/eu sou Napoleão/se eles têm três carros/eu posso voar”; chama-se a Balada do Louco do qual faço o meu hino, e que assim encerra: “Mais louco é quem me diz que não é feliz”.
Eu sou feliz.
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