Depois da estadia prolongada em Istambul, seguimos para a costa com o Mar Negro e a primeira cidade onde parámos foi Bolu. Até lá chegarmos, apanhámos boleia de um táxi e depois de um camião. Sim, um táxi!
Os táxis levam os seus dias a buzinar-nos aqui na Turquia: a ideia é transmitir-nos que estão livres e que nos podem levar. Recusámos sempre e quando foi para nos dar boleia tentámos também por gestos recusar. Mostrámos nossa placa. Gritámos “autostop”. Mas nada. Continuava parado à nossa espera. E por isso acabámos por lhe ir falar e aí percebemos que não queria dinheiro: queria apenas ajudar-nos. Levou-nos até à autoestrada, onde nos deixou: mas lá não estávamos nada seguros. Qualquer berma serve de faixa. Todo o carro lento leva uma buzinadela. Ultrapassagem que é ultrapassagem tanto se faz pela esquerda como pela direita. E acelerar mesmo quando está tudo parado é o melhor truque para se arranjar um espacinho lá mais à frente.
Portanto, volta e meia, e tínhamos que nos encolher porque (na berma) lá vinha alguém disparado. Ainda assim, foi graças a este belo estilo que um camião atravessou duas faixas para parar e nos levar. Se achávamos que era possível? Não! Se aconteceu? Sim! E ainda bem, porque nos levou por várias horas e praticamente até à porta de casa do nosso couchsurfer.
Pelo caminho, ainda parou para nos oferecer um chá, o que por aqui é mais comum que o café em Portugal. Médico, o couchsurfer que nos acolheu, trabalhava durante o dia; mas garantiu que uma amiga (que falava inglês) nos guiaria e levaria a conhecer a cidade e redondezas. Quanta hospitalidade! Com algum constrangimento no início, sabemos que desta estadia resultou uma grande amizade.
Há pessoas que têm o coração no lugar certo e sempre com espaço para mais alguém. E que bom foi partilhar tantos momentos. E na última noite juntos fomos ainda a casa de amigos, com amigos e família, para um serão inesquecível. E é mesmo isto que nos preenche. Fazer parte. Conhecer esta gente. Viver na cultura. Fazer como fazem. Descalçar os sapatos à porta. Ir à casa de banho numa latrina. Beber muito chá turco – numa tulipa. Comer salgados, doces típicos. Batatas cozidas. Café turco, com um copo de água. Bolas de amendoins. Pevides. E no fim, receber um lenço para cobrir o cabelo; porque querem que nos relembremos deles no futuro e durante a nossa jornada.
É ou não é isto o mais lindo lado da vida? Deixarmo-nos viver no outro. Nos sonhos do outro! E assim nos despedimos e seguimos mundo fora.
Entretanto também no caminho para uma outra cidade, Samsun, apanhámos boleia de um outro camião, cujo camionista nos tratou como filhos: desde esperar que nos fossem buscar ao ponto de encontro, a levar-nos a almoçar fora, não faltou com nada. Lá estão as boas pessoas em cada canto desconhecido: mesmo quando o inglês deixa de ser o nosso porto-seguro, permitem-nos falar com o coração.
A mais de 5500 quilómetros de casa com mais de 80 boleias, podem as aventuras não ser épicas, mas sentimo-nos já com recordações para o resto da vida.
0 Comentários