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Uma política que seca o mundo rural

Carlos Carujo

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Por vezes fala-se do «regresso à terra» como se de uma moda extravagante se tratasse. Só que regressar à terra ou continuar a viver dela mais do que uma moda é uma necessidade económica, social e ambiental e uma tarefa cada vez mais dificultada no nosso país.

Não vou falar de uma Política Agrícola Comum construída para proteger apenas as rendas dos grandes proprietários. Não vou falar das dificuldades de acesso às terras por parte dos jovens agricultores. Não vou falar sequer das dificuldades em vender produtos agrícolas num mercado dominado pelas regras dos hipermercados. Vou referir-me aqui apenas a duas medidas governamentais recentes que atacam o mundo rural: a taxação absurda dos pequenos agricultores e a promoção da eucaliptização que reduz biodiversidade.

Primeiro exemplo: a nova lei que obriga os pequenos agricultores independentemente dos valores em causa a ter contabilidade organizada, pagar IVA e descontar para a Segurança Social resulta numa taxação excessiva que secará a produção familiar. E isto, para além de estrangular os parcos rendimentos de quem deles precisa, condena quase ao desaparecimento uma escala de produção micro que é um recurso importante já que fornece um tipo de produtos de valor cultural incalculável em termos extraeconómicos, sendo uma produção de qualidade e ancestral. Fica ainda mais reduzida a nossa escolha relativamente aos alimentos que nos chegam à mesa. Limitam-se ainda mais as possibilidades de estabelecer circuitos cooperativos de consumo de proximidade. E promove-se o abandono dos campos.

Segundo exemplo: a lei que liberaliza a plantação de eucaliptos. Desde a sua aprovação que 92% das novas plantações de árvores são de eucaliptos segundo uma edição recente do jornal Público. Ou seja, tal como previsto, os pequenos proprietários são na prática pressionados a plantar eucaliptos em busca de um rendimento mais rápido numa época de empobrecimento generalizado. Aquilo que aparentemente seria uma promoção da livre decisão individual multiplica-se numa paisagem de conjunto que corresponde a uma eucaliptização de resultados desastrosos num país que é já detentor de um triste record mundial: cerca de um quarto da floresta nacional está ocupada por essa espécie exótica invasora.

Perde a floresta mas ganham os pequenos proprietários? Nem isso: porque a plantação de eucaliptos desvaloriza a terra em que é feita, porque o lucro esperado de curto prazo (e que poderá ser diminuto já que é expectável que o aumento da oferta resulte numa baixa de preços) não compensa os custos da necessidade de conversão para outra utilização nem o aumento dos riscos de incêndio uma vez que os eucaliptos são altamente inflamáveis. A monocultura do eucalipto empobrece os solos, absorve muita água, reduz a biodiversidade, seca a floresta.

Se numa medida se alegava necessidade de simplificar a burocracia na outra acaba por se burocratizar o simples mostrando que os argumentos valem menos que outros valores. E, sob a base de falsos pretextos económicos, na prática a cedência às indústrias da celulose e uma obsessão fiscal que carrega nos de baixo para aliviar os de cima, trata-se de uma rendição à desertificação. É que no fim de contas esta política é como a sua árvore preferida: seca o mundo rural.

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