Os autores do processo judicial pretendiam que os réus fossem condenados, a suas expensas, a demolir todas as obras efetuadas naquelas parcelas de terreno, designadamente parte do piso sintético, bancadas, bilheteiras e a construção onde se encontra instalado o estabelecimento comercial de café e respetiva esplanada, toda a instalação elétrica e respetivas torres de iluminação, painéis publicitários, assim como a levantarem toda a vedação, de maneira a permitir o acesso e utilização aos autores do terreno de sua propriedade.
Era também pedida a restituição daquelas parcelas de terreno e a absterem-se, no futuro, da prática de qualquer ato que impedisse ou diminuísse a utilização das mesmas por parte dos autores.
Não foi considerada procedente a pretensão de reconhecerem terem causado graves prejuízos aos autores, pelo que não foram obrigados a indemnizá-los.
Em síntese, os autores alegaram que durante a década de 1970 fizeram dar entrada um pedido de loteamento de uma parcela. Foi condição exigida para aprovação daquele alvará, a cedência à Câmara de uma parcela de nove mil quinhentos e dezoito metros quadrados, para integrar no domínio privado do Município, destinado a equipamentos, onde seria construída uma piscina, tendo, em 25 de novembro de 1980 sido outorgada a respetiva escritura de doação;
“Até à data de hoje, a projetada piscina e respetivo parque de estacionamento nunca foram construídos naquela parcela de terreno doada para tal fim. A Câmara Municipal de Caldas da Rainha tem utilizado aquela parcela para vários outros fins. Em 1990 a Câmara resolveu usar a referida parcela doada para aí instalar um campo de futebol, à revelia da vontade dos autores, mandando construir um campo de futebol, bancadas e um café aberto ao público, e passando a ocupar, além da parcela doada, mais 5.231 m2 dos autores”, lê-se na acusação.
“Para além disso, a vedação tem impedido que os autores utilizem o terreno que é sua propriedade”, adianta.
O Caldas Sport Club contestou, alegando ser uma coletividade desportiva de utilidade pública sem fins lucrativos e que “as instalações e o relvado sintético do “campo da Quinta da Boneca” revestem um manifesto interesse público desportivo para o concelho de Caldas da Rainha.
Garante que “nunca ocupou abusivamente o que quer que seja, apenas se limita a gerir as instalações e o relvado sintético do “campo da Quinta da Boneca”.
O presidente da Câmara também alegou que “toda a ocupação foi de boa-fé e autorizada verbalmente. A parte ocupada é inculta e não tem qualidade produtiva. Insere-se em área termal, pelo que no mesmo são proibidas obras de construção nova e de ampliação. Decorreram mais de três meses a contar do início da ocupação sem que os autores se tivessem oposto à mesma”. Manifestou igualmente intenção de “adquirir a propriedade do terreno ocupado”.
De acordo com a decisão judicial, “sendo certo que o 1º réu (Câmara), até à data da entrada da presente ação, não construiu a piscina e o parque de estacionamento a que se obrigou, a verdade é que não é pretensão dos autores a resolução da doação, que não foi posta em causa, mas apenas a restituição das parcelas de terreno que foram ocupadas pelos réus, para além da parcela doada ao 1º réu. O 1º réu admite tal ocupação, justificando-se com a existência de autorização verbal por parte dos autores. E de facto resulta da factualidade apurada que a ocupação dos terrenos não foi feita à revelia dos autores”.
Em contrapartida, o pedido formulado (em reconvenção) pelo presidente da Câmara em representação do Município foi totalmente procedente, ou seja, concedido a este o direito de aquisição do terreno dos autores. Foi invocado o artigo 1343º nº1 do Código Civil que diz que “quando na construção de um edifício em terreno próprio se ocupe de boa-fé, uma parcela de terreno alheio, o construtor pode adquirir a propriedade do terreno ocupado, se tiverem decorrido três meses a contar do início da ocupação, sem oposição do proprietário, pagando o valor do terreno e reparando o prejuízo causado, designadamente o resultante da depreciação eventual do terreno restante”.
Quanto ao valor, ter-se-á em conta o valor mais alto atendendo aos fins possíveis de utilização do referido terreno, ou seja fins pomícolas, cujo valor é de € 2,50 o metro quadrado, que tendo em conta que as parcelas inicialmente ocupadas tinham a área de 5.655m2, corresponde ao valor total de € 14.137,50.
Desta forma, e não obstante poder haver recurso desta decisão judicial, o clube manterá a utilização normal do campo da “Quinta da Boneca”. A sentença só transitará em julgado após as férias judiciais, caso não seja interposto recurso.
A direção do Caldas agradeceu aos advogados Miguel Silva e Cátia Vieira por esta “vitória”, apontando que “mais uma vez e pro bono, defenderam com sucesso os interesses do nosso clube”.
Em representação do Município, a defensora foi Ana Paula de Carvalho.
Francisco Gomes
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